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Tractebel: desapontamento é oportunidade?
Código: TBLE3
Último Resultado: 4o Trimestre de 2009
A partir da privatização em 1998, a capacidade instalada da Tractebel tem se expandido a cerca de 5% aa. A receita líquida apresenta crescimento de 14,5% no mesmo período mas este desempenho se deve, em boa parte, a fatores de influência passageira. O registro histórico de lucro é inconsistente; e praticamente não houve crescimento real nos últimos 4 anos.
Usando premissas conservadoras, estimamos um preço justo na faixa de R$ 28,77, representando margem de segurança em torno de 40%. É uma margem razoavelmente atraente para uma concessionária de um serviço essencial que apresenta baixa ciclicidade de resultados.
Prevendo que o retorno ao investidor virá mais do pagamento de dividendos do que da valorização da ação, recomendamos o papel como investimento de longo prazo.
Introdução
Defesa desaponta ...
Nosso investimento na Tractebel tem desapontado de duas maneiras.
Primeiro, querendo aproveitar da queda de preços, mas preocupados com os sinais de problemas econômicas, compramos ações na empresa como investimento defensivo ao longo de 2008. E, de fato, o papel caiu menos que o Índice Bovespa na auge da crise. Só que subsequentemente ele não seguiu o índice de volta ao nível pré-crise.
Segundo, a empresa reduziu o payout do dividendo sobre o lucro de 2009 para dois terços da média dos 5 anos anteriores. Pior, aparentemente, comunicou a analistas que nos próximos exercícios manteria o indicador nos 55%, o limite mínimo citado no seguinte trecho das Notas Explicativas de 2009:
"A política de dividendos da Tractebel Energia estabelece um dividendo mínimo obrigatório de 30% do lucro líquido do exercício, ajustado nos termos da Lei 6.404/76 e, além disso, determina intenção de pagar em cada ano calendário, dividendos e/ou juros sobre o capital próprio em valor não inferior a 55% do lucro líquido ajustado, em distribuições semestrais."
É um dos fatores que devem estar pressionando o preço atualmente.
... os fundamentos não
Por outro lado, os fundamentos da Tractebel se comportaram como previsto: através dos resultados da empresa é impossível deduzir que 2008 e 2009 foram palco de séria crise internacional. Mais relevantes, aparentemente, foram os efeitos da seca no sul.
Entender, investir
Ao rever a Tractebel lembramos da insistência de Warren Buffet que só devemos investir no que entendemos. Estamos conscientes que ainda existem lacunas no setor de geração de energia elétrica que escapam à nossa plena compreensão. Um bom exemplo é a ligação imprecisa entre produção e receita, comentada a seguir.
Tabela de Dados
Últimos Resultados
Ano de 2009
Receita # f(produção)?
Ao analisar a Tabela de Dados, não observamos, ao longo dos anos, relação próxima entre produção em GWh e receita.* Em 2009, enquanto houve queda de 4,5% na produção, atribuída pela empresa "à forte estiagem que afetou a Região Sul do país no primeiro semestre", a receita bruta, em termos nominais subiu 2,4%.
(*A empresa informa que: ".. o aumento da geração hidrelétrica da Companhia não resulta necessariamente em melhoria de seu desempenho econômico-financeiro. Da mesma forma, a redução daquele tipo de geração não implica obrigatoriamente em deterioração do desempenho econômico-financeiro. Esta característica deve-se à adoção do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), que compartilha os riscos de geração hidrelétrica entre os seus participantes.")
De fato, com o lucro líquido avançando modestos 1,7%, a Demonstração do Resultado de 2009 difere muito pouco do ano anterior.
Capacidade instalada avança 4,5%
Em 2009 a Tractebel iniciou operações na UH São Salvador em Tocantins, levando a capacidade instalada da empresa a 6.431 MW, um aumento de 4,5%. Outro evento importante, discutido abaixo, foi a aquisição de 40,07% da UH Estreito. Quando entrar em operação em 2010 esta usina adicionará mais 436 MW ao parque gerador da empresa. Note que a "capacidade total de fornecimento" de energia elétrica, que inclui o contrato firmado com a controlada Itasa, é de 6.468 MW.
Operação Estreito
Críticas
Em 21/12/09 a controladora da Tractebel, GDF SUEZ Energy Latin America (GSELA), vendeu para Tractebel a empresa SUEZ Energia Renovável (SER), outra controlada. A SER detêm 40,07% do Consórcio Estreito Energia, criado em 2002 para implantar a Usina Hidrelétrica Estreito, atualmente em construção.
A operação atraiu críticas porque o preço pago pela Tractebel, R$ 604MM, foi 15,5% acima do valor investido pelo grupo Suez. Aparentemente a justificativa pelo agio foi a redução do risco da execução. Embora a operação - mas não suas condições - fosse prevista há muito tempo, é do tipo que é suscetível à manipulação pelo acionista controlador.
É provável que a acomodação atual da ação da empresa se deva, também, a essa operação.
Análise de Múltiplos
Alerta de sempre
Como sempre, alertamos que a Tabela de Dados é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos da inflação e das variações cambiais. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar a comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização.
Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2010, feita parcialmente por computador.
Nem sub nem super valorização
Nos anos 1999 e 2002 a Tractebel sofreu prejuízos que consideramos atípicos. Em 1999 a forte desvalorização do real impactou as despesas financeiras; e em 2002 houve racionamento. Desconsiderando esses anos, limitamos nossa análise aos 7 últimos anos.
Neste período o retorno sobre patrimônio líquido apresenta pouca variação, com média de 31,5%. O P/L atual de 10,5x está 4,5% abaixo da média do período de 11,1x, enquanto o preço/patrimônio líquido atual de 364,0% excede sua média de 354,1% por 2,8%. Isto é: não há evidência nos indicadores atuais nem de sub nem de super valorização com relação aos indicadores passados.
Concorrente tem indicadores parecidos
Comparando a Tractebel com CPFL Energia, principal concorrente no subsetor de geração privada, encontramos indicadores na mesma faixa para P/L previsto (12,3x), retorno sobre patrimônio líquido (27%), preço/patrimônio líquido (338%) e yield (5,5%). O preço/patrimônio líquido mais baixo da CPFL reflete seu retorno mais baixo.
Diferenças notáveis
É na comparação com as médias de nossa base de dados que diferenças mais notáveis aparecem, com o P/L da Tractebel um terço abaixo da média de 15,7x e seu retorno sobre patrimônio líquido, preço/patrimônio líquido e yield, respectivamente, 79%, 26% e 73% acima de suas médias de 19%, 289% e 3%.
Lembrando, simplificando, que o retorno do investidor aproxima a soma do yield e da taxa de crescimento de lucro e, no caso de ações corretamente precificadas, o P/L reflete este mesmo retorno, concluímos que é o lento crescimento das geradoras que explica as diferenças de yield e P/L.
Só que as diferenças parecem exageradas. Enquanto temos crescimento implícito real de 5,3% aa (10,5-5,2) no caso da Tractebel, o crescimento implícito real do mercado é de 12,7% aa (15,7-3,0). Enquanto 5,3% é uma estimativa razoável pelo crescimento da Tractebel, nem de longe o crescimento médio do mercado é 12,7% aa mais a inflação. Analisando anos anteriores há alguns indícios do mesmo fenômeno, tanto no caso da Tractebel quanto da CPFL. Existem, então, sinais que o subsetor de geração privada tem apresentado um desconto persistente com relação ao mercado.
Baixo patrimônio infla indicadores
A disparidade entre os indicadores preço/patrimônio líquido é mais difícil de elucidar. Diferente da maioria do setores, há uma tendência dos grandes investimentos das geradoras serem concentrados cedo no cíclo de vida da empresa, com a depreciação nos anos subsequentes superando o valor dos novos investimentos. A consequência disso são patrimônios líquidos mais baixos e indicadores de retorno sobre patrimônio líquido, preço/patrimônio líquido e dívida/patrimônio mais altos.
Desconto de 30%?
Concluíndo, embora não tenhamos encontrado nenhum desconto no preço atual relativo aos indicadores históricos da empresa, há indícios de um desconto persistente em relação ao mercado. Comparação dos P/Ls sugere desconto da ordem de grandeza de 33% [1-(10,5-15,7)] neste momento.
Payout errático
O comportamento do payout tem sido erático, variando de mais de 90% de 2005 a 2007 a 52,5% em 2009. As Notas Explicativas de 2009 parecem indicar um nível de 55% nos próximos anos.
Houve queda significativa na dívida líquida em 2009 que agora é metade do indicador da CPFL Energia. Como a dívida em moeda extrangeira representa somente 14,6% da dívida total, o efeito positivo da valorização do real no ano teve pouca participação na melhora.
Cálculo do Valor Intrínseco
Capacidade cresce 5% aa
A evolução da capacidade instalada de geração, exibida na Tabela de Dados, sugere um crescimento de 5% aa. Há praticamente nenhum sinal de crescimento, no entanto, nos dados sobre produção. Além do impacto das estiagens no sul do Brasil em 2006 e 2009, a ausência de informações para os anos 1998 a 2000 distorce o quadro. Não há menção no Relatório Anual de 2009 de efeitos negativos advindos da crise financeira.
Embora estiagens e crises financeiras não possam ser chamadas de "não recorrentes", acreditamos que houve um grau de azar no período analisado, fazendo com que a produção não refletisse com fidelidade o potencial do aumento da capacidade.
O crescimento da receita de 14,5% aa impressiona, mas parte importante dessa cifra se deve ao aumento de tarifas advindo da troca progressiva de "contratos iniciais" por "contratos bilaterais". Com relação aos lucros, os dois anos de prejuízos e a dispersão dos dados dificultam estimativas sobre seu desempenho passado.
Crescimento futuro
No final, estamos obrigados a usar o crescimento histórico da capacidade de geração como nosso ponto de partida para prever a expansão futura do lucro da empresa. A taxa de 5% aa é uma projeção realista? O que há de concreto em andamento?
Atualmente a Tractebel participa da construção de três usinas (UH Estreito 1.087 MW, UT Destilaria Andrade 33 MW, e PCH Areia Branca 20 MW) que agregarão mais 474 MW à capacidade da Tractebel. O start-up da UH Estreito é previsto para o primeiro trimestre de 2011 e as duas usinas menores entrarão em operação em 2010. Esses projetos representam mais 7,4% de capacidade adicional.
Olhando mais à frente observamos que a controladora, GSELA, tem participação na UH Jirau em Rondônia e considera investimento na UH Belo Monte. Seguindo o exemplo da UH Estreito imaginamos que tais participações também serão "vendidas" para a Tractebel. Olhando esses projetos não há razão para supor que a empresa não vá manter o crescimento já visto no passado. E se não mantiver, o alto retorno da empresa assegurará compensação em forma de um payout maior.
Preço justo de R$ 28,77 com premissas conservadoras
Por conservadorismo adotamos como previsão de crescimento de lucro durante a próxima década a taxa de 4% aa. Outras premissas para estimar o preço intrínseco da ação da Tractebel são: lucro base de R$ 1134MM, o lucro efetivo de 2009, payout de 55%, crescimento a partir do décimo primeiro ano também de 4% aa, e taxa de desconto de 7,1%. O resultado, usando o método Fluxo de Caixa Descontado - Dividendo, é um preço intrínseco de R$ 30,82, 50% acima do preço atual de mercado de R$ 20,52. É margem de segurança atraente.
Vamos ser mais conservadores ainda e supor um crescimento de lucro a partir do décimo primeiro ano de somente 3,5%. O resultado é um preço intrínseco de R$ 28,77, 40% acima do preço atual de mercado de R$ 20,52. Consideramos a margem de segurança razoavelmente atraente para um fornecedor de serviço essencial que apresenta baixa ciclicidade de resultados. Aliás, o risco cíclico é mais climático que econômico. Adotamos este cenário como o preferido.
Tabela de Premissas e Resultados
Discussão
Desconto persistente limita valorização
A margem de segurança de 40%, identificada pelo Fluxo de Caixa Descontado em nosso cenário preferido, implica em um desconto no preço atual da ação de 29%. É muito próximo do desconto de 33% com relação ao mercado encontrado na Análise de Múltiplos. A mesma Análise não encontrou nenhum desconto com relação aos indicadores passados da empresa. Por outro lado houve sugestão de um desconto persistente do subsetor de geração privada com relação ao mercado.
Qual seria a fonte desta possível subavaliação: risco regulatório (tanto tarifário quanto ambiental), risco climático, reduzida possibilidade de construção de novas usinas hidroelétricas de grande porte, preconceito contra investimento de prazo de retorno longo?
Seja qual for a explicação, existe a clara possibilidade da margem identificada não ser totalmente eliminada no futuro. Isso não altera o retorno ao acionista; só significa que este virá mais na forma de dividendos do que na valorizão da ação.
Conclusões e Recomendação
A partir da privatização em 1998, a capacidade instalada da Tractebel tem expandido a cerca de 5% aa. A receita líquida apresente crescimento de 14,5% no mesmo período mas o desempenho se deve, em boa parte, a fatores de influência passageira. O registro histórico de lucro é inconsistente; e praticamente não houve crescimento real nos últimos 4 anos.
Os resultados de 2009 diferem pouco de 2008 com nenhum dos anos evidenciando os efeitos da crise na economia. Nas últimas semanas, no entanto, o preço da ação tem sofrido com os impactos da redução do payout e dos termos da compra da UH Estreito da controladora.
Usando premissas conservadoras, estimamos um preço intrínseco na faixa de R$ 28,77, representando margem de segurança em torno de 40%. É uma margem razoavelmente atraente para uma concessionária de um serviço essencial que apresenta baixa ciclicidade de resultados. Recomendamos o papel como investimento de longo prazo (2-5 anos).
A Análise de Múltiplos produz um resultado semelhante mas sugere que a empresa e seu subsetor apresente um desconto persistente com relação ao mercado. Isso sugere que o retorno ao investidor virá mais do pagamento de dividendos do que da valorização da ação.
Lembrando que o indicador dívida/patrimônio líquido é inflado por um patrimônio líquido baixo, a posição financeira da empresa está tranquila.
Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação detém, neste momento, uma posição nas ações da Tractebel.
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