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Petrobras: exageram no pessimismo
Código: PETR4 Data Base: 23/07/04 Preço da PN por 1000 ações: R$ 74.800,00 Número de ações: 1096,54 MM Setor: Petróleo, Produtos/Serviços Principais: Petróleo, gás natural, álcool e derivados.
Beneficiada pela forte desvalorização do real e a alta no preço de petróleo, a Petrobras tem mostrado, nos últimos quatro anos, forte crescimento de receitas e lucros, e altíssima rentabilidade.
Com o câmbio agora estabilizado, e o preço de petróleo provavelmente próximo de seu pico, somente parte da rentabilidade se manterá e haverá forte desaceleração no crescimento.
Os indicadores de mercado refletem essa deterioração de perspectivas mas parecem ter exagerado na dose. A situação é confirmada por análise de FCD que estima que o preço atual da ação apresenta um desconto de 25% com relação ao preço justo de R$ 99.308,00 por 1000 ações.
Embora o desconto não seja grande, permitindo um retorno real de talvez 13% aa, ele oferece uma oportunidade para investidores se posicionarem em uma empresa de primeira linha com algumas características defensivas. Isso é importante na conjuntura atual, onde o feeling do mercado pode empurrar a bolsa para um nível não justificado pelos fundamentos.
Como há possibilidade de queda de preço no médio termo, recomendamos o papel somente para investidores de longo prazo.
Introdução
Paradoxo
Como investimento, a Petrobras está cheia de contradições.
É fortemente beneficiada pela alta no preço internacional de petróleo, cuja duração é impossível prever. Tanto a composição de sua administração, quanto a manutenção de seus preços internos alinhados com preços internacionais de petróleo - um fator absolutamente crucial, são sujeitas à forte risco político. E como uma das empresas mais analisadas da bolsa, teoricamente há pouca possibilidade de encontrar um desconto em seu preço.
Por outro lado, o impressionante histórico da empresa ao longo da última década, junto com seus atraentes indicadores de mercado atuais, têm mantido sua ação no topo de nossa lista das 100MAIS durante meses.
A explicação para o paradoxo é o medo entre investidores que os bons tempos atuais no mercado de petróleo - gerados por escassez, tumultos, terrorismo e especulação - não durem muito. Será?
Tabela de Dados
Valorização imprevista
Em análise da Petrobras em agosto de 2002, embora reconhecendo um potencial de retorno moderado, concluímos que a empresa não oferecia a margem de segurança necessária para um investimento de longo prazo. Ignorando nossa opinião o papel, acompanhando de perto a evolução do Índice Bovespa, valorizou quase 90% nos dois anos seguintes!
Ao rever nosso cálculo do valor intrínseco percebemos que fomos otimistas demais em nossa previsão de crescimento e pessimistas demais em nosso lucro base. Pretendemos corrigir esses erros na presente análise.
Contexto global
Olhando o contexto global neste momento é difícil ficar muito pessimista com o preço de petróleo nos próximos um ou dois anos.
Aquecendo a demanda temos os Estados Unidos e a China em expansão e o Japão despertando de uma recessão profunda.
Ameaçando a oferta há a solidaridade da OPEC, problemas políticas e sociais na Venezuela, Nigéria e Rússia, e o terrorismo rondando as instalações petrolíferas do Iraque e Arábia Saudita - além do ressurgimento de preocupações com a queda no ritmo de novas descobertas de reservas.
Últimos Resultados
Resultados de 2003: retorno impressionante
A Petrobrás produziu, no Brasil e o exterior, uma média de 2.037 M barris de óleo equivalente (óleo, LGN e gás natural) por dia em 2003, 12% acima de 2002. No entanto, o volume de vendas de 2.555 M barris por dia (incluem-se vendas originadas de produção externa) subiu somente 4%, com o aumento de 27% em vendas no mercado externo compensando uma queda de 4% no mercado interno.
Apesar do modesto desempenho de vendas físicas, a receita bruta consolidada do ano aumentou 33%, e o lucro líquido da controladora 79%, em comparação com 2002. O retorno sobre patrimônio líquido de 34% é ainda mais impressionante quando verificamos o aumento de 40% no próprio patrimônio líquido: houve um alto retorno sobre uma base de cálculo muito maior.
De acordo com a empresa, os fatores principais responsáveis pelo salto em receita e lucro foram:
1) "o alinhamento dos preços de faturamento dos principais derivativos no mercado interno, ocorrido no fim de 2002, à média das cotações internacionais" - em outras palavras um aumento nos preços dos principais produtos da empresa no Brasil;
2) maior volume de vendas internacionais "devido, principalmente, à aquisição das empresas argentinas Petrolera Santo Fé e Petrolera Entre Lomas (ex-Perez Compaq) ... além do acréscimo das exportações ... e das receitas geradas pelas Distribuidoras Estaduais de Gás que estão sendo consolidadas a partir de 2003";
3) "a apreciação do real ... que propiciou um ganho cambial (líquido) de R$ 1,64 BI sobre ativos e passivos".
O aumento nos preços no mercado interno é o fator mais importante. Embora a média do preço de petróleo Brent tenha chegado a US$ 28,84/bbl, 15% acima da média de 2002, a média do preço de realização de derivados da Petrobras alcançou US$ 36,26, 41% acima do ano anterior.
Primeiro Trimestre de 2004: queda de preços e lucro
Em relação ao primeiro trimestre de 2003 houve deterioração nos resultados, com a receita consolidada bruta e o lucro líquido da controladora caindo 2% e 27%, respectivamente.
De fato, o volume de vendas cresceu 7%, 4% no mercado interno e 15% no mercado externo. Assim, a queda no lucro se deveu, na maior parte, à decisão de reduzir os preços dos principais produtos vendidos no mercado interno, implementada em abril 2003.
Tanto o preço médio Brent (US$ 31,95/bbl) quanto o preço médio de venda da Petrobras no Brasil (US$ 29,53/bbl) pouco mudaram em termos de dólar de um período para outro. Foi a desvalorização do dólar, que perdeu 17% em termos de reais, que criou as condições para os preços mais baixos.
Principais variáveis
A análise destes resultados ajudam a identificar as principais variáveis que favorecem o lucro da Petrobras: um aumento no volume vendido; um aumento no preço Brent em US$; o repasse, sem defasagem, do preço internacional para o preço de venda da Petrobras em US$; e a desvalorização do real.
Análise de Múltiplos
Aviso de sempre
Alertamos que a Tabela de Dados é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos de inflação e variações cambiais. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização. Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2004. Por razões de espaço não apresentamos os dados de 1993 e 1994.
Receita: situação surpreendente
De 1993 a 2003, após ajustamentos, verificamos que a receita cresceu a uma taxa de 13,5% ao ano. As duas metades do período apresentam comportamentos bem distintos, com uma taxa de expansão de 0% de 1993 a 1998, e de 21,5% de 1998 a 2003. A taxa da segunda metade é um pouco abaixo da valorização do dólar nos mesmos anos.
É uma situação surpreendente: ao longo de todo o período, ou o preço caiu em termos de dólar ou houve expansão de volume vendido próxima a zero.
Volume vendido desacelera
Não é fácil acompanhar a evolução do volume vendido porque um demonstrativo chave da Petrobras, anteriormente preparado em metros cúbicos, agora emprega barris de óleo equivalente.
Tomando o período de 1998 a 2003, concluímos que embora houvesse uma redução total de 12% no volume de derivados vendidos no Brasil, a queda foi mais do que compensada por exportações, vendas no exterior de derivados e óleo cru, e maiores vendas de gás. Chutamos uma expansão no volume total de 3% aa ao longo do período.
De 1993 a 1998 estimamos que o volume vendido, de ponto a ponto, subiu de 77,5 MM m3 para 118 MM m3 em 1998, um aumento de 52%, ou 8,5% aa. Temos que concluir que neste período havia, sim, queda de preço em termos de dólar. A provável explicação é a valorização do real a partir do Plano Real implementada em meados de 1994.
Real em baixo e preço em alta: lucros explodem
Passando para os lucros, verificamos uma taxa de crescimento para o período inteiro de 30,0% aa, com taxas de 5,5% aa e 30,5% aa na primeira e segunda metades, respectivamente.
A cifra alta da segunda metade do período é obviamente resultado, em uma situação de desvalorização e de uma alta no preço internacional, de um preço de petróleo pelo menos parcialmente atrelado ao mercado internacional. O barril de óleo Brent custou US$ 28,84 em média em 2004 contra US$ 12,74 em 1998 (e por volta de US$ 14,00 em 1993).
Ação está barata, ou rentabilidade vai cair
Ao analisar os indicadores é útil, mais uma vez, dividir os 11 anos exibidos nos períodos antes e depois da desvalorização que se iniciou em 1999.
No primeiro período temos um retorno sobre patrimônio médio de 5,5%, um preço/patrimônio líquido de 131% e um preço/lucro de 14,9x. Os valores dos mesmos indicadores no segundo período são 29,1%, 171% e 5,0x. Excluímos os números de 1999 das médias porque não parecem representativos nem de um período nem de outro.
Verificamos uma situação interessante: enquanto a média do retorno sobre patrimônio líquido subiu mais de 6 vezes de um período para outro, a média do preço/patrimônio líquido médio somente dobrou. A média do P/L, por outro lado, caiu quase 70%.
Mais importante, como os indicadores de mercado atuais diferem pouco de suas médias dos últimos 4 anos, eles apresentam a mesma disparidade.
São indícios fortes que, ou a ação está muito barata, ou o mercado não espera a continuação do nível atual de rentabilidade durante muito tempo. Dado que a Petrobras é uma das empresas mais estudadas da bolsa a segunda hipótese é o mais provável.
Oportunidade de longo prazo
É importante observar a oportunidade que essa situação oferece a um investidor de longo prazo. O lucro da Petrobras teria que perder dois terços de seu valor até o P/L atual alcançar o P/L médio da ação nos anos 1993 a 1998, ou metade de seu valor para igualar o P/L atual dos 150 empresas mais importantes do mercado.
Mesmo em um cenário de forte queda de lucratividade, o P/L atual parece excessivamente baixo, sugerindo a existência de um desconto significativo, mas de difícil quantificação (30%?), no preço da ação com relação a níveis pré-1999.
No mínimo, podemos dizer que o investidor de longo prazo não terá que pagar qualquer prêmio em função da alta rentabilidade atual. E no evento da alta rentabilidade persistir além do esperado esse investidor, recebendo um yield de dividendo de 7%, só vai ganhar.
Hedge natural
A dívida total da Petrobras, 89% em moeda estrangeira, representa 83% do seu patrimônio líquido. Deduzindo as disponibilidades a porcentagem cai para 34%. O endividamento da empresa não é excessivo e o preço dolarizado de seu produto, e seus investimentos no exterior, constituem um hedge natural contra variações cambiais. A líquidez corrente de 1,4 é tranquila.
Cálculo do Valor Intrínseco
Novo patamar de rentabilidade
Como a receita da Petrobrás é essencialmente dolarizada, a desvalorização resultou em um novo patamar de rentabilidade. Então vamos adotar como nosso lucro-base o produto da multiplicação do patrimônio líquido do fim de 2003 pelo retorno médio de 29,1% do período 1999-2003. Dá praticamente R$ 15.000 MM.
Velho patamar de crescimento
Para evitar distorções causadas pela desvalorização, nossa premissa para o crescimento de lucro para a próxima década parte dos 5,5% registrado no período 1993-1998 que antecedeu a forte queda do real e a escalada no preço de petróleo - dois geradores de crescimento cujos efeitos já se esgotaram.
Como não houve crescimento de receita em dólares na época considerada, temos de supor que a expansão de lucro foi atipicamente baixa. Então vamos adotar uma taxa de 6% para os próximos 10 anos, caindo para 5% a partir do décimo primeiro ano.
Há margem; mas é suficiente?
Juntando uma taxa de desconto de 11% e um payout de 33% obtemos um valor intrínseco de R$ 90.841, 11% acima do valor atual de mercado de r$ 82.021 MM. Se reduzirmos a taxa de desconto para 10% o valor intrínseco sobe para R$ 108.895 MM (ou R$ 99.308 por 1000 ações) e a margem de segurança sobe para 33% (desconto de 25%). Não é uma margem insignificante mas é um pouco abaixo do nível normalmente procurado.
Premissas e Resultados
Discussão
Apoio de Plano Estratégico
Após rever a premissa de crescimento de lucro à luz do Plano Estratégico Petrobras 2015, de maio de 2004, estamos relativamente satisfeitos que não é nem excessivamente conservadora nem demasiadamente ousada. De 2003 a 2010, por exemplo, o Plano projeta que o volume de derivados vendido no Brasil crescerá 2,4% aa enquanto a venda de gás natural expandirá 14,2% aa.
Qual é a taxa de desconto?
Temos usado o yield do bônus de longo prazo, emitido pelo governo em dólares no exterior, como a taxa de desconto para nossa série de dados dolarizados. Observamos uma tendência de declínio no yield desses papéis que hoje oferecem taxas entre 10,47% e 11,34% (Brasil 24-40). Assim parece razoável considerar a margem de segurança de 33% obtida com a taxa de desconto de 10%.
Há uma oportunidade
É uma margem atraente? Embora abaixo do nível que normalmente procuramos, é bem razoável para um papel de primeira linha.
Mas trata-se de uma empresa cuja rentabilidade depende do preço volátil de uma commodity sujeita a pressões econômicas, políticas e militares. Por outro lado, a altíssima rentabilidade dos últimos anos se deve tanto à alta no preço de petróleo quanto à desvalorização, um processo dificilmente reversível nos próximos anos. Com a queda do real a empresa alcançou um novo patamar de rentabilidade mínima.
Sim, há claro risco de uma queda no preço de petróleo nos próximos um ou dois anos trazer queda de lucratividade e desvalorização da ação. Mas a Análise de Múltiplos mostra que os indicadores da empresa já embutem um cenário de queda cuja severidade parece exagerada.
Aqui é pertinente observar que a empresa tem sido membro cativo de nossa Seleção Defensiva de Graham, um conjunto de ações consideradas apropriadas para um investidor defensivo de longo prazo.
Juntando tudo concluímos que há, sim, uma oportunidade de investimento.
Conclusões e Recomendação
Beneficiada por uma forte desvalorização do real e uma alta no preço de petróleo, a Petrobras, nos últimos 4 anos, tem mostrado alto crescimento de receitas e lucros, e altíssima rentabilidade.
A parte da rentabilidade produzida pela alta no preço de petróleo provavelmente terá vida relativamente curta. Mas a outra parte, assegurada pelo real mais barato, por enquanto permanecerá. A expansão acelerada, no entanto, terminou com a estabilização da moeda.
É praticamente certo uma queda no preço de petróleo gerar uma redução de lucro nos próximos um ou dois anos. Há risco de uma associada queda no preço da ação mas é limitado: estimamos que os indicadores de mercado já embutem uma queda de mais de 50% no lucro da empresa.
Adotando premissas relativamente conservadoras, encontramos um valor intrínseco para a empresa de R$ 108.895 MM (ou R$ 99.308,00 por 1000 ações).
A margem de segurança de 33% que esse valor oferece é abaixo da faixa normalmente considerada atraente. Mas não é comum encontrar essa margem em uma empresa de primeira linha da bolsa que ainda por cima exibe algumas qualidades defensivas.
Assim recomendamos a compra da Petrobras para investidores de longo prazo, alertando que não podem esperar um retorno real médio muito acima de 13% aa, metade gerada pelos dividendos. Investidores de curto e médio prazo tanto podem ser beneficiados por um novo salto no preço de petróleo quanto prejudicados por uma queda.
Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação mantem uma posição nas ações da Petrobras.
Mande sua opinião!
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