CHECK-UP DA EMPRESA |
Natura: novo ciclo de crescimento?
Código: NATU3 Ibovespa: 58405 Valorização em 2013: -8,6%
Em termos reais, a receita da Natura cresceu 7,3% em 2012, um desempenho bom mas abaixo da expansão média anual de 10,9% dos últimos 9 anos. O lucro, impactado por uma base de comparação desfavorável, encolheu.
Como o registro dos últimos 9 anos mostra desaceleração de crescimento e declínio da margem líquida decidimos, mais uma vez, reduzir nossa projeção de expansão de lucro. O resultado é um preço intrínseco para o papel da Natura na faixa de R$ 66,82, 25% acima do preço atual de mercado.
Face a baixa margem de segurança não recomendamos mais a compra da ação. Mas também não recomendamos a venda: se a empresa mantiver o desempenho dos últimos 4-5 anos - que parece provável - podemos esperar um retorno real anual, em termos de dividendos, de quase 8% aa.
E sempre existe a possibilidade do novo ciclo de crescimento, proclamado pela administração, se tornar realidade!
Introdução
Natura +318%; Ibovespa +11%
Temos renovado repetidamente a recomendação da compra da Natura desde a análise de 23/01/08. A partir desta data a ação apresenta um retorno nominal, entre dividendos e valorização da ação, de 318%, ou mais de 33% aa. É quase inacreditável constatar que no mesmo período o Índice Bovespa subiu somente 11%, perdendo para a inflação. A corrida vitoriosa da Natura vai continuar?
Filtrando retórica
Na opinião da administração da empresa, sim. Em seu relatório recente o Comitê Executivo declara: "Em 2012, vivenciamos com muito entusiasmo o início de um novo ciclo para a Natura. Alcançamos o maior patamar de nossa história na qualidade dos serviços prestados às consultoras e consultores".
A Natura possui inúmeras vantagens, começando com seu setor ultra dinâmico, mas como sempre, ao ler os relatórios da empresa, fica difícil filtrar os fatos da retórica.
Tabela de Dados
Últimos Resultados
Ano de 2013
Setor cresce 17,9%, receita 13,5%, lucro 3,6%
Observamos que o mercado de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, onde a Natura opera, cresceu 17,9% nos primeiros 10 meses de 2012 comparado com o mesmo período de 2011. Durante os mesmos 10 meses a empresa deteve 22,4% do mercado brasileiro, contra 23,3% em 2011. No ano todo as receitas internacionais representaram 11,6% do total consolidado.
Apesar do contexto, altamente positivo, os resultados da Natura, à primeira vista, são mistos. A expansão nominal de receita consolidada de 13,5% gerou, após deduzir custos e despesas, crescimento de lucro de somente 3,6% - uma taxa negativa após deduzir a inflação de 5,8% (IPCA). De fato, o quadro é melhor que parece.
Despesas Operacionais sobem 19,1% com ...
Crescendo 12,1%, o Custo de Vendas foi bem comportado. Por outro lado, as Despesas Operacionais, maior centro de custos da empresa, saltou 19,1%. A culpa é das contas Despesas Gerais e Administrativas (DG&A) e Outras Receitas e Despesas Operacionais (OR&DO).
... base de comparação baixa para Despesas Gerais e Administrativas ...
Olhando as DG&A vimos que, de um ano para outro, a Remuneração dos Administradores saltou 119,6% enquanto a Participação dos Colaboradores e Administradores no Lucro explodiu 201%! Analisamos o comportamento destas duas contas ao longo dos últimos 5 anos e concluímos que não dá para afirmar que os valores de 2012 - mesmo que a soma das duas contas neste ano seja a mais alta do período - são não recorrentes. Dá para dizer, sim, que houve crescimento atípico de um ano para outro.
(O principal fator aqui é a Participação nos Lucros e Resultados dos empregados. Houve redução no valor pago em 2011 porque metas não foram atingidos.)
... e alta para Outras Receitas Operacionais, ...
Passando para as OR&DO, a situação é mais simples. Embora tenha havido reconhecimento de créditos do PIS e CONFINS nos dois anos, o crédito de 2011 foi bem maior que 2012. Achamos razoável considerar o impacto da base de comparação baixa em 2011 como um efeito não recorrente.
Mas houve também um valor alto de Outras Despesas Operacionais em 2012 contra um valor ainda maior de Outras Receitas Operacionais em 2011. Como não encontramos explicação para as primeiras não podemos afirmar que o efeito é não recorrente.
O Resultado Financeiro negativo apresenta crescimento de 20,8% mas, de novo, não encontramos evidência de efeitos não recorrentes.
... comprimindo a expansão de lucro em 2012
Concluímos da análise acima que não existem claros indícios de efeitos não recorrentes nos resultados de 2012. Por outro lado, a expansão do lucro líquido de 3,6% teria sido maior sem os efeitos não recorrentes de 2011.
Auto de Infração da Receita
Receita cobra R$ 628 MM!
A Natura emitiu comunicado em 07/01/13 informando que a Receita Federal estava cobrando R$ 628 MM, entre impostos não pagos e multas. A empresa comenta que "Os autos da infração questionam, em síntese, a forma como as empresas estão organizadas (indústria e distribuidora atacadista) e a formação da base do cálculo dos tributos federais IPI, PIS e COFINS."
A Natura ainda informa que: "apresentará impugnação aos autos de infração no prazo regulamentar, e considera, como base na opinião de seus advogados internos e externos, que o risco de perda associado a esse procedimento fiscal é remoto".
Investimentos
Fábula do canguru
Em 20/12/12 a Natura celebrou contrato de compra de 65% da Emeis Holdings Pty Ltd., "fabricante australiana de cosméticos e produtos de beleza premium que opera sob a marca “Aesop” na Austrália, Ásia, Europa e América do Norte". O preço de compra é de cerca US$ 70MM.
À respeito da aquisição, primeira na historia da empresa, o diretor-presidente Alessandro Carlucci aparentemente diz: “Não existe nenhum plano concreto, mas a abertura de lojas ou lojas conceitos em outros países pode ser uma estratégia adotada para crescermos no exterior.” (Exame 07/02/13). Será que o repórter ouviu direto: vão gastar US$ 70 MM e “não existe nenhum plano concreto"?
Em 2012 a empresa investiu R$ 437MM direcionados a expansão fabril, tecnologia da informação e logística. Para 2013, a Natura planeja investir R$ 450MM, com prioridade para expansão de capacidade e tecnologia.
Análise de Múltiplos
Alerta de sempre
Como sempre, alertamos que a Tabela de Dados é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos da inflação, variações cambiais e alterações no regime contábil. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar a comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" (explicados em nota abaixo da Tabela) para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização.
Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2013, feita parcialmente por computador.
Alta rentabilidade?
É importante entender a aparente alta rentabilidade da Natura. A média do retorno sobre patrimônio/líquido, desde a abertura de capital, é 65,1%, a maior de nossa base de dados. Parece uma lição em como fazer muito com pouco, mas não é bem assim: a empresa possui boas margens líquidas mais não são as mais altas de nossa base. Diferente de outras empresas manufatureiras, a Natura gasta menos dinheiro com ativos que engordam o patrimônio e mais recursos com marketing que, após deixarem uma lembrancinha intangível na cabeça do consumidor, viram fumaça! Dividido por um patrimônio líquido baixo o lucro da empresa gera um retorno alto.
Prêmio é reconhecimento de qualidade?
Considerando os dados a partir de 2004, ano da estabilização da margem líquida, temos retorno sobre patrimônio líquido previsto 4% acima de sua média histórica, preço/lucro 15% acima da média e preço/patrimônio líquido 20% acima de sua média.
Levando em conta o maior retorno previsto para 2013, os indicadores apontam um preço atual da ação talvez 15% acima de seu nível médio passado. Seria apressado descrever esse resultado de "sobrevalorização". Como a Natura foi listada somente em 2004, e desde esta data tem apresentado rentabilidade surpreendente, o prêmio pode ser simplesmente reconhecimento pelo mercado da qualidade da empresa.
Mas nem tudo são rosas: houve gradual declínio na margem líquida de 2004 a 2012. Pode não ser coincidência este declínio acompanhar o crescimento da dívida líquida.
Endividar para pagar dividendos?
Não há muita alteração na situação financeira. Apesar da queda de 54% a 52% na razão dívida líquida/patrimônio líquido o indicador está acima do nível ideal. Por que a empresa prefere extrapolar no endividamento em vez de reduzir um pouco o payout de dividendos? Nos últimos dois anos este se aproxima de 100% do lucro. Por outro lado, com despesas financeiras cobertas 6 vezes pelo lucro antes de impostos e despesas financeiras, a posição da Natura está absolutamente tranquila.
Cálculo do Valor Intrínseco
Premissa de crescimento ainda otimista
Os resultados de 2012 parecem confirmação que nossa premissa para crescimento de lucro ao longo da próxima década (de 6% aa) continua excessivamente otimista. Analisando os dados dos últimos 9 anos, período que se inicia com a estabilização da margem líquida, é nítida a desaceleração na segunda metade do período com relação à primeira. O declínio é de 13,0% aa a 8,4% aa no caso das receitas e de 6,8% aa a 5,8% aa no caso dos lucros. A situação é também evidenciada na redução gradual da margem líquida, comentada na seção anterior.
Isso sugere que o Cenário B de nosso Check-Up Express de 09/03/12 - que previu uma taxas de expansão acelerada e perpétua de 4,5% aa - foi a mais realista.
Margem de Segurança cai para 25%
Ao atualizar a estimativa do preço intrínseco, usando o método de Fluxo de Caixa Descontado - Dividendos, além de adotar a taxa acelerada de 4,5% aa para a próxima década decidimos reduzir a taxa perpétua para 4,0% aa. Adotamos o lucro efetivo de 2012 de R$ 861 MM, aparentemente livre de efeitos não recorrentes, como lucro base. E, considerando que o payout médio dos últimos 6 anos é 94%, subimos o payout previsto para 80%. Mantemos a taxa de desconto de 6,6%, cifra muito acima do rendimento atual da NTN-B, com prazo mais próximo de 10 anos, de 4,14% aa.
Obtemos preço intrínseco de R$ 66,82, 25% acima do preço atual de mercado (Coluna A na Tabela). Parece que já entramos na faixa de "não vende, não compra".
Se aumentarmos a taxa de crescimento acelerado para 5,5% aa e mantivermos as outras premissas temos preço intrínseco de R$ 72,81, 36% acima do preço de mercado, ainda insuficiente para recomendar a compra (Coluna B).
Tabela de Premissas e Resultados
Discussão
Sementes de novo ciclo?
No Relatório da Administração de 2012 há várias referências ao início de um "novo ciclo de crescimento". Há menção de entregas mais rápidas, maior disponibilidade de produtos, maior produtividade, uma infraestrutura logística preparada para expansão, etc. Fica difícil avaliar se realmente existe a possibilidade de uma reversão da desaceleração observada ao longo dos últimos 9 anos.
Analisamos o histórico dos investimentos e verificamos, grosseiramente, que a média anual de 2011 a 2013 é o dobro da média dos 6 anos anteriores, em termos reais. É possível evidência que a empresa está plantando as sementes de um novo ciclo. Mas não devemos ignorar o fato que de 2005 a 2012 a receita da empresa também dobrou.
Se a Natura realmente estiver atravessando um período passageiro de investimentos maiores, como parece possível, no mínimo podemos contar com uma melhora sensível do resultado financeiro no futuro - com reflexos positivos para o lucro líquido.
Forte queda em preços setoriais
Vale a pena revisitar o mercado da Natura.
De acordo com os dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC) o setor apresenta crescimento real de 10% aa ao longo dos 16 anos que terminam em 2011. No mesmo período houve expansão do PIB de 3,1% aa e da indústria em geral de 2,5% aa. De acordo com Euromonitor International o mercado brasileiro do setor é o terceiro maior do mundo após os EUA e Japão.
Como vimos, a Natura deteve 22,4% deste mercado nos primeiros 10 meses de 2012. Isso se compara com 17,1% em 2003, na véspera da abertura do capital em 2004. Por outro lado, a margem líquida da empresa apresenta declínio nos últimos 9 anos. A provável explicação surge dos dados da ABIHPEC: nos 5 anos se encerrando em 2011 os preços do setor subiram metade do Índice Geral do FGV. Esta situação séria deve refletir a forte concorrência no setor onde 20 empresas faturam mais de R$ 100 milhões de reais.
Embora um não exclua o outro, fica claro que, para maximizar lucro, redução de custos é tão importante quanto ganho de mercado.
Conclusões e Recomendação
Em termos reais, a receita da Natura cresceu 7,3% em 2012, um desempenho bom mas abaixo da expansão média de 10,9% aa dos últimos 9 anos. O lucro, impactado por uma base de comparação desfavorável, encolheu. Mesmo assim, a empresa anuncia "um novo ciclo de crescimento" a partir do atual programa intenso de investimento.
Como o registro dos últimos 9 anos mostra desaceleração de crescimento e declínio da margem líquida decidimos, mais uma vez, reduzir nossa projeção de expansão de lucro. O resultado é um preço intrínseco para o papel da Natura na faixa de R$ 66,82, 25% acima do preço atual de mercado.
Face a baixa margem de segurança não recomendamos mais a compra da ação. Mas também não recomendamos a venda: se a empresa mantiver o desempenho dos últimos 4-5 anos - que parece provável - podemos esperar um retorno real anual, em termos de dividendos, de cerca de quase 8% aa (4,5% de crescimento + 3,2% de yield).
Agora se realmente entrarmos em "um novo ciclo de crescimento", facilitado pelo forte dinamismo do setor, podemos contabilizar um "tenbagger"* na próxima década.
A posição financeira continua absolutamente tranquila.
Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação administra uma carteira que detém uma posição importante da Natura.
* Um investimento que se valoriza 10 vezes.
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