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Fosfertil: expansão diminui, payout cai
Código: FFTL4 Data Base: 11/02/04 Preço da PN por 1000 ações: R$ 26,00 Número de ações: 106606,37 MM Setor: Fertilizantes Produtos/Serviços Principais: Fertilizantes fosfatados, fertilizantes nitrogenados e produtos químicosfosfatados, fertilizantes nitrogenados e produtos químicos.
Com preços dolarizados e enfrentando reduzida concorrência doméstica, Fosfertil é uma das empresas mais rentáveis da bolsa, e tem remunerado regiamente seus acionistas. Apesar do crescimento físico modesto, a desvalorização dos últimos anos impusionou tanto os lucros da empresa quanto o preço de sua ação.
Essa situação agora muda: parte dos dividendos aparentemente será canalizada para financiar um plano de investimento; e o real estabilizado provocará uma redução na taxa de crescimento. Análises, que levam em conta essas novas circunstâncias, indicam que não é interessante manter o papel em carteira no preço atual.
Introdução
Payout surpresa
Nos últimos anos a Fosfertil tem sido uma empresa de alta rentabilidade e modesto crescimento físico. Como modesto crescimento físico não exige grandes investimentos, a consequência tem sido o pagamento de uma alta porcentagem de seus lucros como dividendos - em outras palavras, um alto payout.
De repente, a empresa anuncia, em seu balanço de 2003, um programa significativo de investimentos e dividendos que representam um baixo payout. Tudo indica que as duas coisas estão relacionadas.
Neste caso a queda no payout de dividendos pode permanecer até o término do plano de investimento. Parece uma perspectiva negativa mas não é necessáriamente. A empresa poderia estar simpesmente trocando altos dividendos hoje por maiores dividendos amanhã. Mas será que os acionistas minoritários ficarão felizes com isso?
Recomendação lucrativa
A Fosfertil foi uma de nossas recomendações mais lucrativas de 2002. Como nosso levantamento recente mostra, até 29/1/04 papel apresentou um retorno de 169%, ultrapassando o Índice Bovespa por boa margem.
Mas será que ainda vale a pena manter a empresa em carteira?.
Tabela de Dados
Resultados de 2003
Disparidade físico-financeira
Em relação a 2002, a receita bruta consolidada de 2003 cresceu 33%, e o lucro 26% - um belo desempenho. Mas porque a produção consolidada expandiu somente 4,5% no ano passado? É certo que produção não é venda, e as importações físicas do grupo - tanto para seu próprio uso quanto para terceiros - aumentaram 17%, mas a disparidade chama a atenção.
A empresa atribui o bom desempenho financeiro ao "aumento das vendas físicas e do comportamento dos preços internacionais dos produtos fabricados pela empresa". Como a expansão das vendas físicas não deve divergir muito da expansão da produção, que foi modesta, e houve valorização do real na época de maior vendas (que reduz a importância de ganhos cambiais no resultado), temos de supor que a alta nos preços internacionais foi o principal responsável pelo desempenho da empresa em 2003.
Situação invejável
Passando para os índices de solvência e líqüidez, verificamos, após três anos de melhoria contínua em seu indicador Dívida Líqüida/Patrimônio Líqüido, que a empresa agora apresenta caixa líqüida - uma situação invejável. Sua líquidez corrente é tranqüila.
Plano de Expansão
Aumento de 20% em produção de concentrado
O Relatório da Administração de 2003 relata que o Conselho da Fosfertil aprovou, no fim do ano, um plano de investimento de R$ 280MM. O plano, com conclusão prevista para 2005, permitirá oferecer 1,77M t/a fertilizantes fosfatados para as misturadoras de NPK. A empresa - que prefere gastar papel com informes sobre a preservação da avifauna nos manguezais do que com informações fundamentais - não informa a capacidade atual.
O plano compreende o seguinte:
Mudança de Política de Dividendos
Segredo de estado
Nunca entendemos - mesmo após trocar emails com a empresa sobre o assunto - a política de dividendos da Fosfertil. Parece segredo de estado. Se incluirmos valores pagos por conta de reservas de lucros de anos anteriores, observamos um payout anual médio de mais de 80% de 1998-2002, com um mínimo de 57% e um máximo de 127%.
Nesse contexto o payout de 27% referente 2003 parece uma mudança importante, especialmente quando anunciado junto com um plano de investimento significativo. O único comentário da empresa que encontramos é a informação que a administração propõe "a retenção dos lucros remanescentes ... para atendimento ao orçamento de capital para 2004, bem como para o capital de giro da empresa".
Porque o receio de se comunicar claramente com os acionistas minoritários?
Ofertas Públicas de Compra de Ações
Sem importância
A Oferta de uma controlada da Bunge, publicada em 13 de fevereiro de 2004, para adquirir a totalidade das ações ordinárias em circulação no mercado da Fosfertil não possui, em nossa opinião, a menor importância.
Como as ações ordinárias compradas pela Bunge da Vale do Rio Doce, em outubro de 2003, representaram mais de um terço das ações em circulação, a empresa tem a obrigação legal de fazer a oferta. As ações em questão representam somente 0,12% do capital total da Fosfertil. No evento da Bunge adquirir todas as ações ainda em circulação teria que pagar a soma irrisória (para a empresa) de R$ 2,5 MM.
Fechamento de capital?
Mais importante, talvez, foi a compra original da participação da Vale, que mostrou a disposição da Bunge de consolidar seu controle da Fosfertil. Não ouvimos nenhuma notícia nesse sentido, mas é sempre possível a Bunge lançar uma tentativa de fechar o capital da empresa, através uma oferta de compra das ações dos preferencialistas minoritários. Observamos que o Grupo de Controle, dominado pela Bunge, já detém 99,65% das ações ordinárias e 66,9% das ações preferenciais da Fosfertil.
Análise de Múltiplos
Rentabilidade campeã
Usando os indicadores apresentados na Tabela de Dados (por questões de espaço omitimos dados de 1993 e 1994), verificamos que o Retorno sobre Patrimônio Líqüido médio dos últimos dois anos, de 44%, é mais do dobro da média dos 8 anos anteriores, de 20,6%. Só que o Preço/Patrimônio Líqüido atual de 351% é quase três vezes a média (do fim do ano) do indicador nos mesmos 8 anos. Observamos ainda que o Preço/Patrimônio Líqüido é somente 7% abaixo de seu máximo histórico, alcançado no fim de janeiro de 2004.
O Retorno sobre Patrimônio Líqüido histórico da Fosfertil é um dos mais altos da bolsa. É a combinação desse alto retorno com o crescimento físico modesto (que elimina a necessidade de grandes investimentos) que tem permitido o pagamento de altos dividendos. Menos significativo, porque baseado em previsão, o Preço/Lucro atual é 74% acima da média dos últimos 10 anos.
Mesmo considerando o aumento em rentabilidade, não há a menor dúvida que a ação da Fosfertil é cara comparada com níveis históricos.
Comportmento cíclico
Comparando os indicadores da empresa com as médias de nosso universo de 150 empresas a situação é mais favorável. Enquanto seu Preço/Patrimônio Líqüido é o dobro do mercado, sua rentabilidade é 2,7 vezes o do mercado e seu P/L apresenta um desconto de 24%.
Se a boa rentabilidade da Fosfertil depender em grande parte - como parece - dos preços do mercado internacional de fertilizantes, temos que supor que os resultados da empresa apresentam um grau de comportamento cíclico. Nesse caso faria sentido o Preço/Patrimônio Líqüido não refletir plenamente sua rentabilidade em uma época favorável. Da mesma forma seria razoável, nas mesmas condições, o P/L apresentar um desconto com respeito do mercado (porque há risco do cíclo se inverter).
Sobrevalorização
Dando mais peso à comparação com os indicadores históricos, a análise parece indicar que o papel da Fosfertil está significativamente sobrevalorizado.
Cálculo do Valor Intrínseco
Preços dolarizados
Primeiro, vamos escolher as premissas para o cálculo, começando com uma projeção do crescimento de lucro durante a próxima década.
Vamos dar uma olhada no passado. Após ajustes, estimamos que, entre 1998 e 2003, a receita líqüida da Fosfertil cresceu a 12% aa e o lucro a 25% aa. Entre 1994 e 1998, no entanto, o crescimento tanto da receita quanto do lucro se aproximava de zero. De 1994 a 2003, juntando os dois períodos, temos uma taxa de crescimento tanto da receita quanto do lucro de 7% aa (devido aos ajustes efetuados, a taxa não é a média dos dois períodos intermediários).
Sabemos que a Fosfertil, que enfrenta reduzida concorrência doméstica, consegue manter seus preços alinhados com o mercado internacional de fertilizantes, cujas cotações são em dólares. Assim a expansão do lucro da empresa tem se beneficiada fortemente da maxidesvalorização do real a partir de 1999.
Como é razoável supor que a maxidesvalorizão tenha terminado, temos que concluir que a empresa não mais se beneficiará da valorização automática de suas receitas em reais. Assim, não acreditamos que a taxa histórica de crescimento de lucro de 7%, fortemente influenciada pela desvalorização recente, permanecerá no futuro.
Há outro aspecto a considerar. Os comentários da empresa indicam que as condições do mercado internacional de fertilizantes, neste momento, são boas, com preços em alta. Pela própria natureza de um mercado, não podemos confiar na manutenção desses preços durante a próxima década.
Falta de continuidade
Enfocando agora o crescimento físico da Fosfertil, verificamos que as informações constantes dos relatórios que acompanham os balanços não apresentam muita continuidade. É mais um exemplo da pobre comunicação social da empresa. A expansão média de vendas físicas da "Fosfertil" de 1995 a 1998 é de 7,6%, A expansão média da "companhia e sua controlada" de 1999 e 2000 é de 5,1%.
Em 2001 os números não fazem muito sentido. Em 2002 não há dados sobre vendas mas aprendemos que a produção de fosfatos e nitrogenados cresceu 4,1% e 3,2%, respectivamente. Em 2003, a produção de fosfatos cresceu 4,5% enquanto produção de nitrogenados, impactada por uma parada programada, caiu 9,1%.
A expansão média do período de 1995 a 2002, ignorando 2001 e as diferenças nos parâmetros medidos, é de 4,9%.
Taxa de expansão de 5%
Há dois fatores positivos a levar em conta. Primeiro, a maior receita do segmento exportador do setor agrícola, gerada pela desvalorização do real, tem intensificado a demanda por fertilizantes. Segundo, a Fosfertil planeja expandir sua capacidade para atender parte dessa demanda.
No fim, levando em conta o desempenho financeiro entre 1994 e 1998, o desempenho físico entre 1994 e 2003, e as boas perspectivas atuais, achamos razoavel adotar 5% como a taxa de expansão de lucro para a próxima década, caíndo para 4% a partir do décimo primeiro ano.
Estimativas e chutes
Para o lucro base, como não parece afetado por fatores extraordinários, simplesmente vamos usar o resultado de 2003: R$ 327MM.
Agora vem a parte mais difícil: estabelecer o payout. Vamos imaginar um payout baixo de cerca de 27% durante 3 anos, voltando para um payout de cerca 57% nos últimos 7 anos da década. Dá um payout médio de quase 50%. É um chute.
Finalmente, há a taxa de desconto. Como nossas taxas de crescimento levam em conta taxas históricas de dados dolarizados, estamos usando a taxa de longo prazo oferecida por bônus soberano brasileiro no exterior. Essa taxa acaba de voltar para o patamar dos 10%.
Alternativas mais ou menos prováveis
Inserindo essas premissas - em nossa opinião a alternativa mais provável - nas fórmulas do Método de Fluxo de Caixa Descontado obtemos um valor intrínseco de R$ 2.987MM (ou R$ 28,00 por 1000 ações). Com um valor de mercado de R$ 2.772MM, temos um Margem de Segurança de somente 8%.
Vamos simular duas outras alternativas, consideradas menos prováveis.
Na primeira, aumentamos o payout para 60%, mantendo as outras premissas inalteradas. Com isso a Margem aumenta para 29%.
Na segunda alternativa, baixamos o payout para 40%, e aumentarmos o crescimento para 7% durante 10 anos e para 5% a partir do décimo primeiro ano. Nesse caso a Margem é 12%.
Nenhuma das alternativas analisadas produz uma Margem de Segurança que justifica a aquisição do papel. Parece provável que o papel esteja próximo de seu preço justo.
Discussão
Análises em conflito
A conclusão do Cálculo do Valor Intrínseco difere da conclusão da Análise de Múltiplos. A primeira considera o papel próximo de seu preço justo, a segunda o acha "claramente sobrevalorizado". É uma possível indicação que as premissas adotadas na estimativa do valor intrínseco sejam otimistas.
Premissas perigosas
Uma taxa de desconto que oscila entre 9% e 10% de um mês para outro é problemática. Constatamos que a adoção da taxa menor em nosso caso mais provável produz um aumento de 20% no valor intrínseco (e uma Margem de Segurança de 29%).
Manter ou não?
Vale a pena investidores atuais manterem o papel visando o retorno de longo prazo? É uma pergunta difícil. Mas dois fatores nos convencem que não é interessante manter o papel em carteira: a sobrevalorização detectada pela Análise de Múltiplos; e a possibilidade de um payout menor ao longo dos próximos dois ou três anos, acompanhado por uma desaceleração na taxa de crescimento.
Há a questão de uma eventual tentativa pela Bunge de fechar o capital da empresa. Dado ao alto preço atual de mercado, e o possível teto de R$ 20,23 estabelecido pela compra das ações ordinárias da Vale, não acreditamos que tal operação ofereça uma oportunidade de ganho.
Conclusões e Recomendação
Beneficiada por preços dolarizados e reduzida concorrência domêstica, a Fosfertil é uma das empresas mais rentáveis da bolsa em termos de Retorno de Patrimônio Líqüido. A combinação desse fato com um crescimento físico modesto, que não exige grande investimentos, tem permitido um alto payout de dividendos.
A divulgação de um payout, referente ao lucro de 2003, abaixo do nível tradicional parece relacionado com a aprovaçao de um plano de expansão, a ser implantado ao longo de dois anos.
Adotando um conjunto de premissas que levam em conta essa nova situação, o método de Fluxo de Caixa Descontado indica que o preço da ação da Fosfertil está próximo de seu valor justo, estimado em R$ 28,00. Por outro lado, a Análise de Múltiplos aponta a sobrevalorização do papel.
Seja qual for, não vimos indícios que a empresa ofereça uma oportunidade de compra ao preço atual. Dada a sobrevalorização detectada pela Análise de Múltiplos, e a possibilidade que tanto o crescimento quanto o payout serão menores durante os próximos anos, também não recomendamos a manutenção do papel por acionistas existentes.
Por final, observamos que a Fosfertil não prima pela qualidade de sua comunicação social. Custa manter os acionistas minoritários informados?
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