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Engie Brasil: a nova renda fixa?
Código: EGIE3 Ibovespa: 107628 Valorização em 2019: 36,9% Setor: Energia
O registro de 12 anos da Engie mostra alta rentabilidade mas pouco crescimento. Mais importante, no contexto deste estudo, é o histórico de bons dividendos e baixa dispersão de resultados.
Juntando dividendos e crescimento, estimamos que a Engie oferece um retorno real de 7% aa. Isso se compara com os juros reais de renda fixa sem risco que se aproximam de 2% aa.
Há risco que o forte aumento no endividamento em 2018 e 2019 resulte numa redução temporária nos dividendos. Consideramos o risco baixo e indicamos a Engie como boa opção para fugir dos juros minguantes da renda fixa.
Introdução
De juros a dividendos
Quando as taxas de juros caem abaixo dos dividendos das ações há um movimento natural de investidores, ansiosos para preservar seus rendimentos, da renda fixa para a renda variável.
Ações antecipam fatos
Outro fenômeno é a bolsa antecipar os fatos. Como o Índice Bovespa, durante um período recessivo, tem subido quase 200% desde seu piso de 2016, supomos que o mercado está se antecipando à recuperação da economia. Nessa valorização o desempenho das ações cíclicas - ações mais sensíveis a variações econômicas - é particularmente notável.
Ainda vai demorar, mas a próxima fase da bolsa, com a economia reestabelecida, será antecipar um novo desaquecimento das atividades. Aqui, de novo, os papéis cíclicos tomarão a dianteira.
Na fase atual da alta da bolsa ainda há ações cíclicas com bastante espaço para valorizar. Mesmo assim, não parece interessante, se o horizonte do investidor for de médio a longo prazo, ainda comprar este tipo de papel.
Procurado: alto dividendo e baixa ciclicidade
Em outras palavras é aconselhável, ao substituir a renda fixa, o investidor procurar papéis oferecendo alto dividendo e baixa ciclicidade.
É essa linha de pensamento que nos levou de volta à Engie. Já tivemos o papel em carteira mas vendemos no aviso da redução de dividendos. A limitação durou pouco e, com isso, perdemos a grande valorização da ação nos últimos meses de 2018. Aí já era tarde para recomprar.
Mas, como no caso recente da Sanepar, foi outro efeito da redução de juros - a queda na taxa de desconto, e a associada valorização do preço justo de ações - que agora nos deram nova chance.
Gráfico de Preço de 17 Anos
Tabela de Dados
Alerta
Alertamos que a Tabela de Dados acima é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos da inflação, variações cambiais e alterações no regime contábil. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar a comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" (explicados em nota abaixo da Tabela) para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização.
Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2019, feita parcialmente por computador.
Últimos Resultados
Ano de 2018
Evolução de Resultados Consolidados
Trading e curto prazo impulsionam Receitas
Os principais segmentos que impulsionaram o salto na Receita foram operações de trading ("assumir as posições de mercado relacionadas à variação do preço da energia elétrica"), iniciadas em 2018, e operações de curto prazo ("compra e venda de energia cujo objetivo principal é a gestão da exposição da Companhia na CCEE").
O volume de energia elétrica vendido no ano ficou praticamente estático. No Brasil com um todo houve crescimento de somente 1,1% no consumo de energia líquido em 2018.
Eventos não recorrentes aumentam Despesas
O forte aumento nas Despesas Operacionais líquidas é fruto de eventos não recorrentes. As Despesas de Vendas, Gerais e Administrativas, foram inflacionadas pela "reversão, em 2017, da provisão relacionada à discussão judicial sobre benefícios de aposentadoria". Por sua vez, foi o ganho na alienação de investimentos em 2017, não repetido em 2018, que beneficiou Outras Receitas Operacionais.
O aumento no Custo de Vendas se deve, principalmente, às compras destinadas às novas operações de trading de energia, e ao maior número de transações no mercado de curto prazo.
Receitas Financeiras caem, Despesas sobem
Finalmente, o salto nas Despesas Financeiras Líquidas se deve tanto à queda nas Receitas, causada pelo valor menor aplicado e a redução nos juros, quanto ao aumento nas Despesas, gerado pela majoração dos juros a pagar sobre as concessões, e o maior endividamento.
9 Meses de 2019
Evolução de Resultados Consolidados
Indenizações turbinam resultados
O destaque são as Receitas Operacionais Líquidas onde a subconta Outras Receitas Operacionais foi turbinada por "indenizações por descumprimentos de condições contratuais (atrasos, no caso) incorridos pelo fornecedor responsável pela construção da Usina Termelétrica Pampa Sul".
Viés baixo carbono
Houve três eventos societários importantes até setembro de 2019:
- Início da construção do Conjunto Eólico Campo Largo – Fase II, localizado nos municípios baianos de Sento Sé e Umburanas. Com investimento estimado de R$ 1,6 BN, e entrada em operação prevista para o início de 2021, o Conjunto, composto de 11 centrais, terá 361,2 MW de capacidade instalada.
- A entrada em operação comercial do Conjunto Eólico Umburanas – Fase I, localizado em Umburanas, composta de 18 centrais e com capacidade instalada de 360,0 MW.
- Aquisição de participação, em conjunto com uma subsidiária integral, sua controladora final, e o Caisse de Dépôt et Placement du Québec, de 90% da Transportadora Associada de Gás S.A. (TAG) de titularidade da Petrobras. A TAG possui 4.500 km de gasodutos, 12 instalações de compressão de gás (6 próprias e 6 subcontratadas) e 91 pontos de entrega. A participação da Engie Brasil na TAG é de 29,25%.
Análise de Múltiplos
Mais cara mas mais rentável
Medida pelo preço/lucro e o preço/patrimônio líquido, a tabela sugere que a ação da Engie está 7%-30% mais cara que sua média passada. O prêmio maior do segundo indicador é justificado, em parte, pelo maior retorno atual da empresa.
No caso da comparação com seu setor, os grandes prêmios exibidos pelo preço/patrimônio líquido e preço/lucro da Engie devem se explicar, em boa parte, pelo retorno bem maior da empresa e o fato que os baixos preços das energéticas estatais puxam para baixo as médias do setor.
O mesmo acontece na comparação com o mercado, só que neste caso pesa o fato que o preço/patrimônio líquido das geradoras tende a ser naturalmente maior que o mercado. (A maior parte do investimento normalmente ocorre no inicio de um projeto, com depreciação nos anos seguintes não sendo compensada por novas inversões de peso. O patrimônio mais baixo inflaciona a razão.)
Payout de quase 100%!
É notável que tanto a Engie quanto seu setor exibam um yield de dividendo que é o dobro do mercado. A razão parece ser uma combinação do maior payout das geradoras - com a Engie alocando quase 100% do lucro nos últimos anos - e, mais uma vez, a contribuição das energéticas estatais, cujos baixos preços tendem a elevar o yield médio do setor.
Dívida líquida/patrimônio líquido de 161%
Em relação ao endividamento da Engie, o indicador dívida líquida/patrimônio líquido do fim de 2018 excede em muito as médias passadas da empresa, do setor e do mercado. Desde então o indicador, presumivelmente em função da aquisição da TAG, tem aumentado ainda mais, atingindo 161% no fim de setembro.
Em resumo
Em resumo, a análise sugere que a Engie está mais cara que no passado mas apresenta vantagem de rentabilidade nas comparações com o setor e mercado. Por outro lado, o alto endividamento pode ameaçar, pelo menos temporariamente, o alto payout de dividendos.
Tabela de Análise: Descontos/Prêmios
Cálculo do Valor Intrínseco
Viúvas e órfãos sem vez
O setor de energia elétrica traz um problema que o saneamento, outro setor de baixa ciclicidade, não apresenta: complexidade. Como já comentamos no passado, em outras épocas, em outros lugares, investimentos na indústria de energia, devido a seu baixo nível de risco, foram considerados apropriados para viúvas e órfãos! Não é o caso no Brasil com sua regulamentação complicadíssima - e onde uma presidenta que se considerou especialista na área quase quebrou o setor.
Num nível mais prático sempre tivemos dúvidas sobre o tratamento a ser dado, ao aplicar a técnica de Fluxo de Caixa Descontado, ao fim de uma concessão. Felizmente, no caso da Engie, o grande número das concessões tende a minimizar este problema.
Premissas conservadoras
Dado às dúvidas, o cálculo do valor intrínseco da empresa que segue procura ser o mais conservador possível.
Para o lucro base da empresa resolvemos adotar, para a data base do fim de 2019, o lucro efetivo nominal do fim de 2018 de R$ 2.314 MM. A análise do mesmo, nos Últimos Resultados indica que é pouco influenciado por eventos não recorrentes. E o valor não difere muito do valor anualizado do lucro dos 9 meses de 2019, após deduzir o impacto da indenização recebida.
Apesar do payout médio de dividendos de 79,5%, aplicamos um desconto e adotamos a cifra de 75%.
Agora, ao examinar o crescimento ao longo dos últimos 10 anos, constatamos que a receita cresceu a 2,9% aa, a capacidade própria 2,4% aa, a produção 2,2% e o lucro 0.5%! Houve um período particularmente medíocre dos anos 2015-17 que atribuímos à recessão.
Com a recuperação da economia acreditamos que a expansão do lucro se aproximará da receita. Assim, para as taxas de expansão futura mantemos as premissas da análise do Raio-X da empresa de 29/06/18: 10 anos de crescimento de 2% aa seguido por crescimento perpétuo de 1% aa. (Será uma tragédia para o Brasil se a expansão média do consumo de energia elétrica nos próximos anos não superar essas estimativas!)
Margem de segurança atraente
Empregando o programa do site de MoneyChimp (ver Sites Úteis) obtemos os resultados abaixo. Avaliamos que a margem de segurança obtida de 29%, com premissas conservadoras e uma empresa de risco relativamente baixo, é atraente.
Tabela de Premissas e Resultados
Discussâo
Substituto atraente
Com yield de dividendo atual de cerca de 5%, chama a atenção a vantagem que a Engie apresenta sobre a renda fixa. Um título do governo de 7 anos, teoricamente sem risco, neste momento oferece juros reais de somente 2,4%! Com seu passado de dados consistentes, sinal de baixo risco, a empresa se apresenta como um substituto atraente.
E, de fato, o retorno oferecido pela Engie vem, principalmente, dos dividendos. O histórico financeiro da empresa sugere que não podemos esperar muita valorização futura através de crescimento de lucro.
Mas um yield de cerca de 5% permite, com expansão de lucro e dividendos de modestos 2% aa, retorno total de cerca de 7% aa (5% + 2%). Além de superar com folga a renda fixa sem risco é comparável com o retorno oferecido pela Weg. Esta empresa campeã, próxima de seu preço justo, promete, com yield de 1,3% e expansão prevista de 6% aa, o mesmo nível de retorno. Só que a Weg, pelo menos na teoria, é uma firma cíclica.
Endividamento ameaça dividendo?
O único aspecto negativo é o forte aumento no endividamento da Engie nos últimos dois anos. Com costas quentes e receitas garantidas não há nenhum risco de insolvência, mas pode haver reflexo temporário nos dividendos. Será que a Engie consiga manter seu alto payout?
Conclusões e Recomendação
O registro de 12 anos da Engie mostra alta rentabilidade mas pouco crescimento. Chama a atenção o medíocre desempenho dos anos recessivos 2015-17.
Análise de múltiplos sugere que ação não apresenta nenhum desconto enquanto o cálculo do valor intrínseco, mais sensível a taxa de juros, aponta uma margem de segurança de 29% (ou desconto de 23%).
Mais importante, no contexto deste estudo, é o histórico de bons dividendos e baixa dispersão de resultados. São estas qualidades que credenciam o papel como substituto atrativo da renda fixa.
Juntando dividendos e crescimento, estimamos que a Engie oferece um retorno real de 7% aa. Isso se compara com os juros reais de renda fixa sem risco que se aproximam de 2% aa.
Há um risco: o forte aumento no endividamento em 2018 e 2019 pode, eventualmente, resultar numa redução temporária nos dividendos. Consideramos que o risco seja baixo e indicamos a Engie como boa opção para fugir dos juros minguantes da renda fixa.
Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação montou, recentemente, uma posição da Engie.
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