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Bradesco: desaceleração cíclica ou estrutural?
Código: BBDC4 Ibovespa: 79444 Valorização em 2018: -5% Setor: Bancos
Nos últimos 12 anos o Bradesco tem apresentado desempenho medíocre. Não fica claro se isso caracteriza comportamento cíclico ou desaceleração estrutural. Ou ambos.
Estimativas, baseadas tanto na Análise de Múltiplos quanto no método Fluxo de Caixa Descontado, sugerem um potencial de retorno modesto no curto a médio prazo mas um possível ganho atraente na fase de alta do próximo ciclo.
Na atual tumultuada conjuntura política e econômica aconselhamos a investidores aguardarem um preço do papel mais convidativo.
Introdução
Longo registro, baixa variabilidade
Nossa abordagem conservadora de investimento em ações parte da identificação de empresas que apresentam longo registro de crescimento moderado com baixa variabilidade.
Confirmada a probabilidade que as condições operacionais do passado continuarão a vigorar, em maior ou menor grau, no futuro, usamos o crescimento passado, devidamente ajustado por fatores como a maturação natural do negócio e a conjuntura econômica, para fazer projeções conservadoras de crescimento futuro.
Isso permite a estimativa, através do método de Fluxo de Caixa Descontado (FCD), de um preço intrínseco, ou preço justo, que pode ser comparado com o preço de mercado.
Grande prêmio
Se essa comparação mostrar que o preço justo apresenta grande prêmio (ou "margem de segurança") sobre o preço atual - tipicamente 50% no caso de uma empresa de risco médio - concluímos que existem condições para um investimento de bom retorno e baixo risco.
O graal sagrado é encontrar uma empresa onde cálculos mostram grande potencial com premissas que são claramente conservadoras.
Firmas excelentes mas cíclicas
Na prática poucas empresas exibem um passado extenso e consistente. Por outro lado, existem numerosas firmas excelentes que são "cíclicas". São empresas cujos resultados sobem e descem com as condições econômicas e mercadológicas. No caso de empresas "pró-cíclicas" seus resultados tendem a cair durante recessões ou épocas de grande oferta, e subir durante períodos de expansão ou demanda alta.
Ciclos e flutuações
Quando tentamos adaptar nossa abordagem para lidar com empresas cíclicas surgem problemas sérios. Primeiro, ciclos empresariais são mais flutuações dilatadas que bonitas curvas senoidais. Muitas vezes, por exemplo, é difícil identificar o começo e o fim de um ciclo, ou saber se uma flutuação é cíclica, estrutural ou resultado de efeitos extraordinários.
Segundo, para estimar o crescimento passado de uma empresa cíclica é necessário, teoricamente, os dados relativos a vários ciclos, cada um dos quais se estendendo ao longo de 5-12 anos. Dados desta duração são difíceis de acessar, e dificilmente o contexto operacional se manterá inalterado durante prazos tão prolongados.
Prioridade aos múltiplos
Para enfrentar as dificuldades associadas ao uso do FCD para avaliar empresas cíclicas temos dado prioridade a estudos focados na Análise de Múltiplos, baseados na suposição - precária - que os últimos 12 meses representam um ciclo inteiro.
Ao reavaliar o Banco Bradesco, instituição aparentemente pró-cíclica, essa problemática ressurge com força.
Gráfico de Preço de 10 Anos
Tabela de Dados
Alerta
Alertamos que a Tabela de Dados acima é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos da inflação, variações cambiais e alterações no regime contábil. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar a comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" (explicados em nota abaixo da Tabela) para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização.
Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2018, feita parcialmente por
computador.
Últimos Resultados
Primeiro Semestre de 2018
Seguros representam 30,6% do lucro
Não encontramos, entre as extensas demonstrações do Bradesco, nenhuma atualização da origem do seu lucro por segmento. Só ficamos sabendo que as Atividades Financeiras respondem por 69,4%, e as Atividades de Seguro 30,6%, do total.
Receitas da Intermediação Financeira caem 24,9%, Despesas 31,1%
Analisando a demonstração consolidada do banco relativa aos primeiros 6 meses de 2018 constatamos que as Receitas da Intermediação Financeira caíram 24,9% comparadas com o mesmo período de 2017.
Dentro dessas receitas temos Operações de Crédito (58% do total) descendo 9,8%, o Resultado de Operações com TVM (27%) 28,3%, e o Resultado de Seguros, Previdência e Capitalização (16%) 35,5%.
Em contrapartido houve queda de 31,1% nas Despesas de Intermediação Financeira.
Aumento de 6,1% em Receitas de Serviços
Entre Outras Receitas Operacionais, que não fazem parte da Receita da Intermediação Financeira, destacamos o aumento nas Receitas de Prestação de Serviços de 6,1%. Houve queda de 1,5% nos Prêmios Retidos de Seguros, Previdência e Capitalização.
No grupo das Outras Despesas Operacionais houve queda de 4,9% na Variação de Provisões Técnicas de Seguros, Previdência e Capitalização enquanto os Sinistros Retidos e Despesas de Pessoal se mantiveram practicamente inalterados.
Aumento do lucro depende de efeito não recorrente
A surpresa ficou por conta do Imposto de Renda e Contribuição Social que apresentou valor positivo comparado com o alto valor negativo de 12 meses antes. O resultado - que supomos não seja recorrente - e que tem forte impacto sobre o lucro líquido, se deve ao valor diferido composto de "Base negativa de contribuição social" e "Prejuízo fiscal".
Como resultado da conjugação dessas receitas e despesas - e com grande ajuda do Imposto de Renda positivo - o lucro líquido consolidado cresceu 12,7% nos primeiros 6 meses de 2018.
Grande retração nas atividades operacionais?
Infelizmente, nem o Relatório de Análise Econômica e Financeira do Bradesco que trata do segundo trimestre, nem o Comentário de Desempenho que acompanha a Demonstração do Resultado Consolidado Acumulado em 30 de Junho, submetido à CVM, ajuda muito em interpretar os números desta última.
A redução de um quarto nas receitas de intermediação financeira, e de quase um terço nas despesas, parece indicar uma grande retração nas atividades operacionais no primeiro semestre de 2018.
Análise de Múltiplos
Tabela de Análise: Descontos/Prêmios
Modelo imperfeito
A Tabela de Análise tenta levar em conta os efeitos da ciclicidade. Ao fazer isso, como explicamos na Introdução, se supõe que os últimos 12 anos representam um cíclo completo. Como há diversas ciclos econômicos (nacional, internacional, de commodities), e são muito irregulares - especialmente no Brasil, cuja história recente é marcada por eventos como hiperinflação e regimes econômicos heterodoxos, o modelo é muito imperfeito. Há ainda a limitação de termos somente único conjunto de indicadores para cada ano do registro passado (em vez, por exemplo, de dados mensais).
Ciclos bancários
Dependente de variáveis como o nível de depósitos, empréstimos, adimplência e juros, o setor bancário é cíclico. Na Tabela o fato da média dos 6 maiores retornos do Bradesco dos últimos 12 anos exceder a média dos 6 menores retornos por 30% (21,5/16,5) fornece uma medida do grau de ciclicidade. (No caso da supercíclica Randon temos uma cifra de 315%!).
Margem de 26%-28% praticamente garantida
Ajustando o preço/lucro atual do Bradesco para refletir o retorno médio ao longo do ciclo, obtemos um desconto de 21% com relação ao preço/lucro médio de 12 anos. É parecido com o desconto de 22% verificado na comparação do preço/patrimônio líquido atual com sua média de 12 anos.
Os descontos dos dois indicadores representam margens de segurança de 26% (11,6/9,2) e 28% (222/173). Essas cifras medem o potencial de ganho no evento dos indicadores associados ao preço da ação atual alcançar, no futuro, os indicadores médios do ciclo - uma possibilidade praticamente garantida.
Margem de 61% muito provável
Não garantida, mas bem provável - se a empresa é de fato cíclica, e sua trajetória de longo prazo de expansão - é a possibilidade do preço/patrimônio líquido atingir a média dos 6 indicadores máximos do ciclo. Neste caso o potencial de ganho é de 61% (278/173).
Maior risco do setor financeiro
Os indicadores atuais do Bradesco, com a exceção do yield do dividendo, estão parecidos com as médias atuais do seu setor. Por outro lado, o Bradesco e o setor bancário exibem boa vantagem com relação ao mercado: os retornos previstos estão maiores e os indicadores preço/lucro e preço/patrimônio líquido menores. Entendemos que isso reflete a visão do mercado do maior risco apresentado pelo setor financeiro.
Apesar dos descontos apontados pelos preço/lucro e preço/patrimônio líquido relativos ao mercado, e o aumento no payout do dividendo nos últimos 2 anos (ver Tabela de Dados), o prêmio apresentado pelo yield (não ajustado) do banco é marginal.
Cálculo do Valor Intrínseco
Crescimento desacelera?
Ao longo dos últimos 12 anos, nosso ciclo teórico, o lucro do Bradesco se expandiu a pouco mais de 3% aa, em termos reais. Se, explorando ao máximo nosso base de dados, compararmos o lucro médio dos últimos 12 anos com a média dos 12 anos se iniciando em 1993, temos expansão de cerca de 11% aa.
Aquisições rareiam
O forte crescimento do Bradesco observado ao longo de 26 anos se deve muito a aquisições. Há a impressão, no entanto, que houve arrefecimento dessas operações nos anos recentes. Houve, por exemplo, 20 incorporações de bancos ou operações bancárias entre 1997 e 2004, enquanto as únicas compras de destaque nos últimos anos foram as compras do Banerj em 2011 e do HSBC Brasil em 2016.
Com as oportunidades de aquisições de peso se tornado cada vez mais raras no Brasil haverá impacto importante sobre a expansão futura do banco.
Bancos viram salas de compulador
Mais, mesmo se beneficiando de ganhos de automação, parece que o destino dos bancos é de virar simples salas de computador. Nessa condição, e enfrentando a competição de fintecs mais ágeis, é pouco provável uma aceleração nos retornos de longo prazo. Pelo contrário.
Assim chutamos, para efeito do emprego do Fluxo de Caixa Descontado, que o crescimento ao longo da próxima década fica em 5% aa. Face a probabilidade de uma recuperação cíclica nos próximos anos é uma premissas considerada conservadora.
Lucro base problemático
Também problemático, para o uso do FCD, é o ponto de partida do fluxo futuro de lucros, o lucro base. Aparentemente posicionado na fase negativa do ciclo, o lucro efetivo de 2017 parece baixo. Por outro lado, um lucro base que parte do retorno médio dos últimos 12 anos parece alto, dando peso excessivo aos anos iniciais na estimativa do preço intrínseco.
De novo, um lucro base mais realista parece ficar entre as extremidades. As duas alternativas estão simuladas nas Análises de Sensibilidade abaixo.
Análise de Sensibilidade - Preços Intrínsecos (R$)
Margem de segurança de 20%
Se adotarmos, como premissas, crescimento de lucro de 10 anos de 5%, seguido por crescimento perpétuo de 3%, números considerados realistas, obtemos preços intrínsecos de R$ 28,00 e R$ 39,00 com as duas alternativas de lucro base (Cenários A e B na Tabela abaixo).
Como a base mais realista deve se aproximar mais do número produzido pelo retorno médio atribuímos um peso de dois terços à cifra maior. O resultado de R$ 35,00 dá uma margem de segurança de 20% (35,00/29,26) ou desconto de 16% (1-29,26/35,00) (Cenário C na Tabela).
Tabela de Premissas e Resultados
Discussão
Ordem de grandeza comum
A margem de segurança obtida com o FCD na seção anterior de 20%, com a ajuda do chutômetro, é da mesma ordem de grandeza das margens de 26% e 28% identificadas na Análise de Múltiplos com premissas conservadoras.
Animação transitória?
Agora a comparação, na Análise, do preço/patrimônio líquido atual com a média dos 6 indicadores máximos sugere uma chance razoável de obter um retorno na faixa de 61% na fase da alta do próximo ciclo.
Para alinhar esse potencial com o FCD é necessário ter como premissas, por exemplo: lucro base do retorno médio do ciclo, taxa de crescimento de 10 anos de 5,5% aa e taxa perpétua de 3,5% aa. Mas note que uma taxa acelerada de 6% aa e perpétua de 3,0%, premissas menos ousadas, já produzem margem próxima de 50%, um nível atraente.
Observe, no entanto, que um retorno de 61% pode não refletir projeções de lucros de longo prazo mas simplesmente animação transitória com a fase de alta do ciclo!
Ciclos ou curva em S
Ainda examinamos os dados históricos do Bradesco no papel. Os gráficos dos retornos e dos lucros do banco ao longo dos últimos 26 anos, tanto podem ser interpretados como uma série de ciclos de negócios, como também uma curva "S" da vida de uma empresa que culmina com desaceleração após fase de bom crescimento. É ainda possível que os gráficos reflitam uma combinação dos dois modelos.
O setor bancário é considerado pró-cíclico mas é possível que a natureza oligopolistica do setor no Brasil, e suas atividades de seguros, suavizam esse aspecto. Já comentamos as mudanças radicais sacudindo o setor. Será que o Bradesco tirará proveito da automação crescente; ou existe o risco de perda de competitividade num mercado invadido por fintecs mais ágeis? Veremos mais ciclos robustos, ou uma desaceleração gradual nos retornos?
Mr Market menos tranquilo
Resumindo, temos potencial de curto a médio prazo limitado com margem de segurança na faixa de 20%-28% indicado pelas duas metodologias usando premissas conservadoras. É um cenário modesto. Mais animadora é a possibilidade, vislumbrada pela Análise de Múltiplos, do retorno se estender a cerca de 61% na fase de alta do próximo ciclo. No FCD isso corresponde a premissas relativamente ousadas.
Mas não podemos ignorar a conjuntura atual com o Brasil num momento crítico. Estamos na véspera de uma eleição, com grande déficit orçamentário, dívida pública crescente e o real derretendo. Nenhum dos candidatos inspira confiança em sua capacidade de lidar com essa situação com competência.
Nessas condições é melhor aguardar uma oferta mais generosa de um Mr Mercado menos tranquilo. Um preço de R$ 25,00, por exemplo, já produz uma margem de segurança de 40% no Cenário C, um nível atraente no caso do Bradesco.
Operações rotativas
Agora, para um investidor de longo prazo existente, cuja posição no papel já gerou bons lucros e altos impostos potenciais, e que vendeu alguns lotes próximos do preço justo da ação nos últimos meses - o caso da Carteira Concentrada A&R - pode ser interessante repor as vendas no preço atual.
Essas operações "rotativas" permitem rentabilizar uma posição estratégica e reduzir a conta dos impostos.
Conclusões e Recomendação
Nos últimos 12 anos o Bradesco tem apresentado desempenho medíocre. Não fica claro se isso caracteriza comportamento cíclico ou desaceleração estrutural. Ou ambos.
Estimativas baseadas tanto na Análise de Múltiplos quanto no método de Fluxo de Caixa Descontado sugerem um potencial de retorno modesto no curto a médio prazo mas um possível ganho atraente na fase de alta do próximo ciclo.
O yield de dividendo não ajuda a compensar o crescimento indiferente previsto: apesar do aumento no payout seu nível atual mal ultrapassa a distribuição oferecida pelo mercado.
Na atual tumultuada conjuntura política e econômica aconselhamos a investidores aguardarem um preço do papel mais convidativo - a não ser que haja desejo de repor, em uma posição de longo prazo, lotes de ações vendidos recentemente quando o preço do papel se aproximou do valor justo da ação.
Nota Importante: De acordo com nossa política de transparência, informamos que o responsável por Ação&Reação detém uma posição substancial das ações do Bradesco.
Mande sua opinião!
Últimas notícias:
1 - Preço justo à vista (08/02/19)
O que fazer?
No estudo acima, de 21/09/18, estimamos um preço justo para o papel do Bradesco na faixa R$ 35,00-39,00. Acrescentando inflação de 4% (a data base da análise é de 31/12/17) temos, atualmente, um intervalo de R$ 36,00-R$ 41,00. Agora, no fechamento de hoje o mercado já registra o preço de R$ 44,67. O que fazer?
- Reduzir a taxa de desconto
Durante 2 anos utilizamos a taxa de desconto de 6,0% em nossas estimativas de preços justos. Neste período a taxa da NTNB de 10 anos, até agora considerada a taxa sem risco, tem caído por volta de 1,5 pontos. Assim resolvemos reduzir nossa taxa de desconto para 5,5%.
- Redefinir a taxa sem risco
Embora, na prática, não faça muita diferença, daqui para frente vamos adotar com taxa sem risco a NTNB que vence em 2045. O prazo de 26 anos se alinha melhor com o prazo, teoricamente infinito, usado para estimar o preço justo de ações. E note que, normalmente, a maior parcela do preço justo é gerada no período "perpétuo" que segue a primeira década de operações.
Neste momento a NTNB2045 oferece um juro real de 4,58%. Assim nossa nova taxa de desconto de 5,5% embute um prêmio de cerca de 1 ponto percentual. Adotamos esta folga por conservadorismo, avaliando que o retorno da NTNB esteja próximo de seu piso e veremos majoração ao longo das próximas décadas.
- Refazer as estimativas do preço justo
Adotando a nova taxa de desconto, e levando em conta os resultados de 2018, recém divulgados, refizemos as estimativas do preço justo, ou intrínesco, do Bradesco.
Análise de Sensibilidade - Preços Intrínsecos (R$)
Tabela de Premissas e Resultados
Há potencial mas é limitado
Seguindo o mesmo processo adotado no estudo de 21/09/18 acima chegamos a um preço intrínseco na faixa de R$ 48,38-R$ 50,99, 8%-14% acima do preço de mercado atual - que representa a margem de segurança oferecida por um eventual investimento.
Como comentamos no estudo principal, a característica cíclica do setor bancário torna muito aproximadas as estimativas de preço intrínseco de seus membros. Mesmo assim, podemos concluir que ainda há potencial de valorização, mas é bastante limitado.
Manter
Como a recuperação da economia deve favorecer os bancos - e ainda empurrar os preços para cima - é interessante detentores atuais das ações do Bradesco manterem suas posições por enquanto. Mas não parece boa ideia a entrada no papel de novos investidores.
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