O todo poderoso P/L: tão utilizado quanto incompreendido
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O "x" da questão que confunde
O indicador preço/lucro de uma ação é o preço de uma ação cotada em bolsa dividido pelo lucro líquido por ação da empresa envolvida. Normalmente é chamado o "P/L" ou o "múltiplo" da ação, e é freqüentemente seguido por um "x" (ex: 6.1x) que significa "vezes". Comumente se diz que é "o número de anos em que o investidor recebe seu investimento de volta". Não é exatamente isso porque, sob condições normais, o lucro de uma firma aumenta a cada ano e o retorno, conseqüentemente, seria mais rápido do que sugerido pelo indicador. Invertido o indicador vira o yield do lucro (earnings yield).
P/Ls para todos os gostos
No cálculo do P/L normalmente emprega-se o preço atual da ação e, ou o lucro do ano passado, ou o lucro previsto para o ano corrente. Mas também são freqüentemente calculados os P/Ls para os próximos três anos ou mais. E Benjamin Graham (o pai de "value investment") , em seu trabalho "The Intelligent Investor" (O Investidor Inteligente), adota um P/L baseado no preço atual da ação e a média do lucro de vários anos passados como um de seus critérios de investimento.
O enigma
O aspecto fascinante do indicador é o fato que é um dos indicadores mais utilizados e menos compreendidos do mercado de ações. O problema é simples: se o P/L estiver baixo parece atraente porque o investidor "recebe seu investimento de volta" em poucos anos; mas se o P/L estiver alto sugere que o mercado avaliou que os lucros irão aumentar no futuro. Onde está a verdade? Devemos procurar papéis com altos ou baixos P/Ls?
Uma medida da confiança do mercado
A resposta é um pouco complicado. Primeiro, um P/L muito baixo sugere que haja algum problema associado com a ação, enquanto um P/L muito alto sugere que a ação esteja cara - ou o lucro muito baixo. No entanto, no mundo dos "growth stocks" (ações de crescimento), como a Microsoft, um P/L muito alto freqüentemente reflete um taxa fenomenal de crescimento. Assim o indicador normalmente pode ser entendido como uma medida do grau de confiança que o mercado tem no futuro desempenho da ação - e na firma como um todo. Neste último sentido vários papéis tradicionalmente têm apresentado altos P/Ls.
Importante é o contraste
Na verdade um P/L sozinho significa praticamente nada: é o contraste com a situação mostrada por outros indicadores que é importante. Se uma companhia tiver uma boa rentabilidade, e não houver nenhuma razão de esperar uma deterioração significativa, é claro que um P/L baixo é atrativo, especialmente se estiver inferior a seu nível histórico.
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Freud explica
Nossa visão é um pouco heterodoxa. Acreditamos que o P/L, na verdade, é uma tentativa inconsciente do mercado de estimar a taxa interna do retorno da ação - a taxa que compreende tanto os dividendos futuros quanto a valorização esperada no preço da ação. Assim uma comparação entre o P/L e uma estimativa desta taxa indicaria a atratividade da ação.
Os Zulus em apoio
Jim Slator, em seu livro "The Zulu Principle" (O Princípio Zulu), adota um indicador que utiliza o P/L de uma maneira parecida. Este fator ele chama o fator PEG ("Price Earnings Growth factor" ou "fator preço/lucro/ crescimento"). Para obter o PEG de uma ação, ele divide o P/L pela taxa estimada do crescimento de lucro da companhia. Ele considera um PEG abaixo de 0.75 (e idealmente abaixo de 0.66) como uma indicação da atratividade de uma ação; e um PEG de 1.5, por exemplo, como um claro sinal que a ação está cara.
Brasil e o PEG
É interessante observar que 55% das ações de nosso banco de dados (cobrindo 150 companhias) tem um fator PEG abaixo de 0.67. Se, no cálculo do fator, substituímos o crescimento de lucro pela taxa interna de retorno, a porcentagem aumenta para 74%. Em outras palavras, conforme nossa interpretação 74% das ações no mercado são negociados a menos que dois terços de seu valor "justo". É mais uma indicação - se ainda existir alguma dúvida na mente de alguém - que o mercado domestico de ações está muito barato. E note bem: os dois fatores não se baseiam em estimativas excessivamente otimistas do futuro, mas nas taxas de crescimento registradas nos últimos 5-10 anos.
O mundo e o PEG
Um procedimento descrito pelo "The Economist" demonstra como uma versão do fator PEG pode ser empregada para comparar a relativa atratividade dos mercados de ações em países diferentes. Aqui divide-se o P/L de cada mercado pelo crescimento previsto no PIB para os próximos anos (5 anos no caso). A idéia é que o crescimento do PIB forneça uma aproximação da taxa de expansão dos lucros corporativos. Se chutarmos para o Brasil um P/L de 6x e uma taxa de crescimento de 5 anos de 2.5% e, para os Estados Unidos, os valores 20x e 1.7%, que não devem estar muito longe da verdade, obteremos fatores PEG de 2.4 e 11.8, respectivamente.
O que a americana tem?
Assim, conforme nossas estimativas grosseiras, o PEG dos EUA é atualmente 4.9 vezes mais alto que o do Brasil (11.8/2.4). É revelador comparar isso com o número de 2.4 obtido em janeiro de 1996, quando a revista inglesa fez seu cálculo. Isso sugere que, em relação ao mercado dos EUA, o mercado brasileiro de ações está agora duas vezes mais atraente de que há quase três anos atrás! 26/10/98
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