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Sadia SA - parte 2
Composição da Receita e Concorrência
A Sadia classifica seus produtos nos segmentos de Industrializados, Aves, Suínos e Outros.
Os Industrializados consistem em produtos resfriados como presunto, lingüiça, salame, mortadela, salsicha e massas frescas, congelados como pratos prontos, sobremesas, empanados, pizzas, hambúrgueres, quibes, almôndegas e salgados, e margarinas. Aves e Suínos consistem em derivados de carnes comercializados in natura. Em 2002 Industrializados contribuíram com 45%, Aves 38%, Suínos 11% e Outros 6% da receita consolidada total.
Exportações representaram 42% da receita bruta. Enquanto Industrializados geram 71% da receita no mercado doméstico, no mercado externo é o segmento de Aves que domina, com 72% do total exportado.
De acordo com dados do fim de 2001, a Sadia é líder do mercado nacional nos segmentos de Abate de Aves, Abate de Suínos, Exportação de Aves e Industrializados de Carne. Entre os últimos, a empresa tinha 51,5% do mercado de carnes congeladas, seguida pela Perdigão com 29,0%, e 29,8% de carnes resfriadas, seguida com Perdigão com 24,5%.
Diversificação e Valor Agregado
Como os negócios da Sadia são sujeitos à volatilidade típica dos mercados de commodities, é da interesse do grupo diversificar seus mercados e aumentar sua participação em segmentos de valor agregado. Nesses últimos segmentos os atributos de branding e diferenciação fornecem um grau de proteção contra os imprevistos das commodities.
É interessante comparar os resultados do grupo em 2002 com os de 1993 para se ter uma idéia de até que ponto a Sadia está tendo sucesso nessas áreas. Em relação às exportações, verificamos que enquanto as vendas para 40 países contribuíram 25% de sua receita total em 1993, em 2002 as vendas a 65 países geraram 42% do total.
Devido à mudança no sistema de classificação, é mais difícil avaliar o avanço de Industrializados mas entendemos que este segmento contribuiu 33% em 1993, contra 45% em 2002. Como é de esperar, no mercado doméstico o sucesso é bem maior, com o segmento aumentando sua participação de 42% para 71% no mesmo período.
Tudo indica que a empresa está conseguindo criar as condições para aumentar sua rentabilidade. Os números da Tabela de Dados parecem confirmar a tendência na prática, com a Margem Líqüida e o Retorno sobre Patrimônio Líqüido melhorando ao longo do período.
Finalmente, é importante observar que, no mercado doméstico, a Sadia tem conseguido bons resultados em um período de relativa retração. Tudo indica que a empresa responderá muito favoravelmente à recuperação na economia brasileira prevista para 2004.
O desempenho da Sadia em 2002 foi espetacular. Aparentemente sem a ajuda de fatores extraordinários o grupo conseguiu ultrapassar os resultados de 2001, que foram fortemente auxiliados por problemas sanitários entre os produtores da Europa. A Receita Bruta consolidada e o Lucro Líqüido do controladora aumentaram 16,7% e 16,2%, respectivamente. Da receita total, 42% vieram de exportações.
Entrando nos detalhes, verificamos que vendas maiores de Industrializados no mercado doméstico, e de Aves no mercado externo, explicam 80% do avanço total. Industrializados no mercado domestico se beneficiaram de uma recuperação de preços, turbinados, por sua vez, pela renovação de embalagens de toda a linha e o lançamento de 56 novos produtos. No mercado externo o foco no incremento de volumes compensou a queda de preços.
Mas há um aspecto estranho: como já mencionamos, a Equivalência Patrimonial apresentada pela controladora praticamente equivale ao resultado operacional da empresa (repetindo a situação do ano anterior). Assim, à primeira vista, as vendas brutas de R$286MM das controladas em 2002 produziram quase todo o lucro da Sadia enquanto as receitas da controladora de R$4.403MM geraram quase nada!
Certamente, as subsidiárias se beneficiam de muitas das atividades desempenhadas pela controladora, mas a situação não deixa de ser incongruente. Infelizmente a grande reestruturação do grupo nos últimos anos dificulta o esclarecimento do assunto. É possível que as despesas associadas com esta reestruturação seja parte da explicação. Mas a parte mais importante é, sem dúvida, o crescimento das despesas financeiras ao longo dos últimos anos, impulsionado pelo efeito da desvalorização sobre a dívida em dólar.
Impressionante, no entanto, é o fato da forte expansão de vendas ter continuado no primeiro trimestre de 2003, tradicionalmente o mais fraco do ano, com a Receita Bruta consolidada se expandindo 40% sobre o mesmo período do ano anterior!
Enfocando a posição financeira, verificamos que a dívida total consolidada do fim de 2002 foi de R$3.2BN, com 81% do total denominado em moeda estrangeira. A dívida representou 154% do Patrimônio Líqüido, uma cifra altíssima.
O único aspecto positivo desta porcentagem é o fato de ela estar abaixo do nível de 162% em 2001, e acima do nível de 135% no fim do primeiro trimestre de 2003. É importante observar que, no primeiro trimestre, a valorização do real gerou uma variação cambial positiva.
Consideramos outros aspectos da posição financeira na próxima seção.
Rentabilidade e Crescimento
Sempre alertamos que a Tabela de Dados é sujeita a todo tipo de distorção, com destaque para os efeitos de inflação e variações cambiais. Aqui estamos mais interessados em tendências e ordens de grandeza do que números precisos. Para facilitar comparação com o período anterior, usamos "dólares ajustados" para os anos a partir de 1999, fortemente impactados pela desvalorização. Não se deve atribuir importância excessiva à previsão de lucro para 2003.
No caso de Sadia a Tabela apresenta uma distorção adicional. Embora o grupo tenha passado por constantes alterações societárias, a de 1998, quando sua controladora mudou (ver História da Empresa), foi a mais radical. Assim os dados antes e depois deste ano não são totalmente compatíveis.
Como acreditamos que sejam mais compatíveis que as receitas, só calculamos a expansão no caso dos lucros, obtendo, após ajustes, uma taxa de 11% aa ao longo da década exibida. Embora seja um desempenho bom, observamos que a série apresenta bastante volatilidade, variando significativamente de um ano para outro.
Sem dúvida, a fonte dessa volatilidade é a dependência da empresa de mercados de commodities. Do lado da receita, a empresa tem exposição aos mercados de carnes in natura; do lado do custo ela depende de rações feitas de milho e soja.
Mesmo assim não há como brigar com um Retorno sobre Patrimônio Líqüido médio de 11,2% ao longo do período. Nossos dados abrangem 16 anos de lucros ininterruptos.
Analisando a série de dados, chama a atenção o fato do período a partir de 2001 ser o mais rentável da história da empresa. Devido à volatilidade de seus resultados passados, no entanto, ainda não é possível concluir que houve uma alteração permanente no patamar da lucratividade.
Indicadores de Mercado e Posição Financeira
Passando para os indicadores de mercado, enfocamos o Preço/Patrimônio Líqüido. Como observamos na Introdução, se compararmos o indicador atual com seu valor no fim de cada um dos últimos 10 anos, o mesmo só não está mais baixo do nível de 1998. De fato, no terceiro ano de rentabilidade recorde o indicador atual se encontra 38% abaixo da média da década!
O Preço/Lucro conta a mesma história. Se ignorarmos o P/L de 2003, que parece otimista demais, ainda temos indicadores em 2002 e 2001 que estão 70% abaixo da média dos 8 anos anteriores!
Certamente investidores, consciente da volatilidade dos lucros, podem desconfiar que a rentabilidade recorde dos últimos anos não vai durar. Mas a cautela parece exagerada.
Por último, voltamos à posição financeira da empresa. Em termos brasileiros, não há dúvida que um indicador Dívida Líqüida/Patrimônio Líqüido de 150% esteja muito alto.
Em contrapartida, se excluirmos as variações monetárias e cambiais, as Despesas Financeiras Líqüidas de 2002 estão cobertas mais de 5 vezes. E mesmo em uma situação extrema, como do ano passado, a inclusão de variações monetárias e cambiais ainda resulta em um Índice de Cobertura de mais de 2 vezas.
A situação parece tranqüila, mas o histórico da empresa nos ensina que o lucro é capaz de cair para menos da metade de um ano para outro. Há sempre a chance de uma eventual combinação infeliz de baixo lucro com a desvalorização da moeda ameaçar o registro secular de lucratividade.
Como os lucros da empresa apresentam grande volatilidade, adotamos, como lucro base inicial, o produto da multiplicação do Patrimônio Líquido do fim de 2002 pelo Retorno médio histórico de 11,2%. Dá R$141MM.
Não temos razão para imaginar que o crescimento histórico de lucro de 11% aa vai mudar. Mas, devido à volatilidade dos resultados, sabemos que a estimativa é um tanto precária. Para assegurar que erramos pelo lado conservador vamos adotar, como premissa para a próxima década, a taxa de 9% aa. A partir do décimo primeiro ano a taxa cai para 5% aa.
Adicionando às premissas um Payout de 33% e uma Taxa de Desconto 12% obtemos, pelo Método de Fluxo de Caixa Descontado, o Valor Intrínseco de R$909MM. Infelizmente, o valor é somente 5% acima do Valor de Mercado de R$867MM.
Reanalisando as premissas, chegamos à conclusão que o lucro base pode estar excessivamente baixo. É provável que a combinação do fim da reestruturação do grupo, o real mais barato, a conquista de novos mercados e a participação crescente de produtos de valor agregado tenham produzido uma mudança na patamar de rentabilidade da empresa.
Resolvemos aumentar o lucro base para 13% do Patrimônio Líquido do fim de 2002. Por acaso a porcentagem é também o retorno médio dos últimos 4 anos. Dá um lucro base de R$164MM. Segundo, aumentamos o crescimento de lucro dos próximos 10 anos para 10% aa: além do impulso da desvalorização do real desde 1999, a provável recuperação da economia brasileiro a partir de 2004 certamente aumentará a demanda por alimentos. As outras premissas permanecem inalteradas.
Obtemos um Valor Intrínseco de R$1.135MM, 31% acima do Valor de Mercado atual. Estamos chegando!
Finalmente, vamos examinar o efeito de uma redução em nosso taxa de desconto de 12% para 10% antes do fim de 2004, uma hipôtese bastante provável - lembre-se que a bolsa olha talvez um ano para frente. Com essa premissa o Valor Intrínseco salta para R$1.621MM, 87% acima do Valor de Mercado, uma Margem de Segurança bastante atraente, amplamente justificando investimento na Sadia.
O que dá credibilidade ao resultado do Cálculo do Valor Intrínseco é sua próximidade, em termos de grandeza, das constatações da Análise de Múltiplos. O desconto apresentado pela Análise vai de 38% a um menos confiável 70%. Essas porcentagens equivalem a uma Margem de Segurança entre 61% e 233%. Dando um peso quatro vezes maior para o primeiro número, os resultados das duas avaliações se aproximam (87% x 95%).
É intrigante a idéia que o grupo, em conseqüência da crescente diversificação de seus mercados e da maior participação em sua receita de produtos industrializados, está começando a aumentar sua rentabilidade e reduzir a variabilidade de seus resultados. Embora os últimos 27 meses ofereçam indícios disso ainda não há evidência clara.
Enquanto essa questão não foi esclarecida, a variabilidade dos resultados do grupo representa um problema sério para o investidor. O registro histórico mostra que alguém que se posiciona na ação sempre corre o risco de enfrentar uma súbita queda em rentabilidade. Pior, qualquer diminuição de lucro será alavancada pela alto endividamento do grupo.
Após várias décadas, parece que o estrutura do grupo Sadia e a definição de seus segmentos de atuação agora atingiram certa estabilidade. A despeito das mudanças, ao longo de pelo menos 16 anos o grupo tem conseguido um resultado médio bom, atravessando pelo menos 16 anos sem sofrer prejuízos. Em contrapartida, a dependência de mercados de commodities para comprar insumos e vender produtos tem produzido resultados de grande variabilidade.
Ainda não existem evidências irrefutáveis, mas há indícios que o grupo está conseguindo melhorar sua rentabilidade e diminuir a volatilidade de seus resultados. Junte a isso seu sucesso em crescer no mercado doméstico em um período de retração e tudo indica que podemos esperar uma forte resposta da empresa se a economia do país, a partir de 2004, começar a acelerar.
Estimamos que a ação da empresa ofereça uma atraente Margem de Segurança de cerca de 87% (ou desconto de 46%), um resultado confirmada pela Análise de Múltiplos. Outro aspecto positivo é a análise mais qualitativa resumida nos dois parágrafos anteriores.
No outro lado do balanço temos o pesado endividamento da empresa. Devido à volatilidade de seus resultados há sempre o risco de uma combinação infeliz de dívida em dólar em alta, provocada por desvalorização do real, com lucro em baixa.
Dados os fortes pontos positivos da Sadia acreditamos que vale a pena correr seus riscos. Assim recomendamos a empresa como investimento de longo prazo (3-5 anos). Neste horizonte chutamos um retorno no investimento, entre dividendos e ganho de capital de 16-17% aa, em termos reais.
Enfatizamos a questão de longo prazo. Como vimos, embora a tendência dos lucros da empresa seja positiva, há sempre a possibilidade do preço da ação, em determinado ano, ser atingido por uma repentina queda em rentabilidade.
Mas também não devemos ignorar a possibilidade de uma valorização da ação no curto a médio prazo. Além do preço do papel não refletir adequadamente os resultados magníficos dos últimos 27 meses, há notícias que a multinacional Cargill está considerando a aquisição de uma participação estratégica na empresa.
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